Olá amigos!

Neste texto, vou responder às perguntas da Cléia e Bárbara que leram o texto sobre os prós e contras de fazer a faculdade de psicologia, e a pergunta delas vai na direção de um questionamento que eu faço no texto de que as pessoas que fazem psicologia para se autoconhecer talvez tivessem caminho mais fácil fazendo uma terapia do que ficando anos dentro da Universidade. Seguindo a minha linha de pensamento eu disse:

“Pode parecer estranho o que eu vou dizer, mas autoconhecer-se não é para qualquer pessoa a qualquer hora. Vi muitos estudantes de psicologia, especialmente no meio do curso, totalmente perdidos. De tanto questionar a própria vida, a própria família, a formação, o sentido das coisas, acabaram se perdendo. E, se perdendo, às vezes desistiam do curso. Este pode ser sim um ponto negativo para fazer a faculdade de psicologia. Ainda mais se a pessoa tiver alguma predisposição a alguma doença mental”.

Então, a Bárbara e a Cléia me perguntaram se ter tido algum problema emocional como depressão ou compaixão excessiva (quando o problema alheio afeta os sentimentos da pessoa que escuta ou tenta ajudar) poderia prejudicar na carreira. Este texto procura, portanto, responder a estas perguntas.

Avaliação psicológica para ser psicólogo

Muitas pessoas não sabem mas antigamente havia uma avaliação psicológica antes de o candidato ao vestibular entrar na faculdade de psicologia. O exame avaliava se o estudante tinha capacidade para ser psicólogo. O processo era semelhante ao exame da OAB, no sentido de avaliar a competência, só que era realizado antes do ingresso no curso. A diferença, entretanto, era ser uma avaliação psicológica e não uma avaliação de conhecimentos. Claro, atualmente esta exigência não mais existe e qualquer um pode entrar, cursar e ser diplomado como psicólogo ou psicóloga.

Durante a minha graduação, havia um colega que todos sabiam possuir um grave transtorno mental. Por questões éticas, claro, não vou dizer com detalhes. Mas era notório como professores e alunos ficavam quando ele falava coisas sem sentido nas aulas. Muitos professores defendiam que este aluno não poderia formar. Outros achavam que o próprio mercado cuidaria de selecioná-lo (para fora do trabalho como psicólogo).

E, neste contexto, surgia a pergunta se não seria positivo ter uma prova que selecionasse – como existia antes – para que candidatos com sérios transtornos mentais não pudessem fazer a faculdade. Obviamente não existe mais quem defenda esta posição de forma contundente, já que o discurso de toda a sociedade é o da inclusão. Além do mais, a pessoa pode cursar faculdade porque quer aprender, mais do que ter aquela disciplina como profissão.

Uma doença mental pode afetar a profissão dentro da psicologia

Definir doença mental iria muito além dos limites de um texto como este. Mas podemos entender a doença mental como sofrimento psíquico. Quando sofremos por um determinado problema, seja ele interno ou externo, poderíamos dizer que estamos passando por um distúrbio, quer dizer, por algo que incomoda o nosso equilíbrio. Até aí tudo bem. A questão é sabermos se esta “doença mental”, se este distúrbio, se este sofrimento é leve, moderado, grave ou crônico.

Em outras palavras, todos nós podemos passar por perturbações, por dificuldades, por sofrimentos. Como alertava Freud, a diferença é de grau e não de estrutura. Ou seja, é a quantidade de sofrimento que vai afetar os sujeitos de formas diferentes. Foi a partir destes conhecimentos obtidos na clínica, que no início do século passado começou-se a ter a exigência de que todo psicanalista deveria fazer a sua própria análise. Tese defendida por Jung.

Este pensamento influenciou também a psicologia e atualmente toda pessoa que quer ser um psicólogo ou psicóloga clínica ouve a recomendação – durante a faculdade – para também fazer terapia com um psicólogo ou psicóloga clínica. O objetivo de toda terapia é o autoconhecimento. Pois, na clínica, apenas a partir do momento que estamos bem conosco mesmo é que podemos ajudar nossos pacientes. Pontos cegos em nosso processo de autoconhecimento poderiam fazer com que as nossas interpretações e intervenções fossem falhas e conduzissem a erros no diagnóstico ou tratamento.

Além disso, pessoas que tenham sérios transtornos mentais como psicoses graves – nas quais a pessoa surta – ficariam alertadas de seus problemas e, deste modo, poderiam conduzir sua carreira dentro da psicologia em outra área como a área acadêmica, de pesquisa, enfim, uma área que não fosse diretamente ligada ao contato com outros sofrimentos graves, já que nesse caso o próprio profissional teria problemas para orientar seus pacientes.

Conclusão

Bem, respondendo de forma mais direta às perguntas da Bárbara e da Cléia, posso dizer que ter uma predisposição a uma doença mental pode afetar a carreira dentro da psicologia, apenas, se esta provável doença mental for grave e incapacitante. Na maior parte dos casos, os sofrimentos psíquicos moderados ou leves não afetam de forma decisiva o aprendizado durante a faculdade ou o trabalho depois da formatura.

Ou seja, ter tido depressão ou ter uma grande empatia com os demais, uma certa sensibilidade para o sofrimento de quem está próximo, provavelmente não vai prejudicar ou tolher a carreira dentro da psicologia. Como qualquer sofrimento mental e emocional pode ser trabalhado na terapia, se o psicólogo tiver interesse de seguir na psicologia clínica (esta área é mais propensa a que o sofrimento alheia interfira na saúde mental do profissional) seria altamente recomendável que o estudante e o profissional fizesse também a sua terapia. Assim como acontece na psicanálise.

Outras áreas da psicologia como hospitalar, escolar, social, organizacional, claro, também exigem equilíbrio emocional e mental. Mas o procedimento é sempre o mesmo, trabalhar as suas questões no consultório de seu próprio psicólogo (ou supervisor clínico) para que os problemas pessoais não afetem de forma negativa no trabalho.