Por que ficamos presos no que nos faz sofrer? Por que não soltamos o sofrimento e demoramos tanto para ir em busca de oportunidades melhores?
Existe uma história que expressa de uma maneira brilhante o conteúdo do nosso texto de hoje. A história diz mais ou menos o seguinte:
“Certa vez, um macaco descobriu um vaso no qual havia um coco (o fruto do coqueiro). Acontece que ele não conseguia retirar do vaso o coco e a sua mão ao mesmo tempo, de forma que manteve a sua mão dentro do vaso por horas, sem conseguir o que queria e sem conseguir se livrar da situação”.
O apego ao sofrimento
Esta história fantástica resume em uma única imagem o apego ao sofrimento. O macaco quer o coco, porém, de acordo com a situação do momento (o vaso), ele não consegue o que quer. Não obstante, ele continua querendo e fica preso na armadilha de seu próprio querer, de seu desejo – o que lhe gera sofrimento.
Em nossas vidas, também passamos por situações parecidas. É só substituir o macaco por um ser humano, o coco por um desejo X e o vaso (o problema) por uma dificuldade. Por exemplo, a garota que deseja ser amada. Ela vai e procura o amor e a sua felicidade em um relacionamento tumultuado e conturbado (o vaso). Embora ela não se aperceba, ela está vivenciando o mesmo que o macaco da história, ou seja, quer muito algo que não vai conseguir retirar dali.
O mesmo acontece com aquela pessoa que quer ganhar dinheiro (o coco) em um trabalho-vaso. Para todos, é óbvio que o dinheiro não vai aparecer, mas o que se observa é a dificuldade de largar a possibilidade remota e ilusória de um lucro.
E mil outros exemplos podem ser pensados. E porque temos uma tendência de fazer isso?
A identidade
Sartre dizia que a existência precede a essência, quer dizer, nascemos e vivemos e só depois vamos descobrir (ou construir) quem somos. Se não é tão simples saber quem somos, vamos criando certas formas provisórias como referência como personagens em um romance: o garoto rebelde, a patricinha, o estudioso, o esportista, a inteligente, depois o trabalhador, o pai, a mãe, a chefe…
Papéis sociais, enfim. Mas dizendo a partir da perspectiva do apego ao sofrimento é como se um sofrimento fosse melhor do que nada. Melhor um relacionamento ruim do que nenhum relacionamento. Melhor uma possibilidade remota de lucro em um emprego do que nenhum emprego. O vazio assusta, portanto, antes o ruim do que o pior.
O paradoxo
Sempre que leio esta história do macaco, penso o porquê de ele simplesmente não soltar o coco e procurá-lo em outro lugar. Ou soltar o coco e virar o vaso para que ele caia. Mas esta não é a moral da história. A moral da história se pode depreender do que passaria na cabeça dele:
“Eu quero o coco. Só que não tá saindo. Mas vou continuar tentando, pois eu quero o coco. Só que não está saindo, mas vou continuar tentando. Ainda que continue preso nisso, vou continuar tentando, mesmo que não esteja saindo agora, porque eu quero o coco”… e por aí continua…
Conflito = guerra de duas partes: uma parte quer uma coisa, a outra parte quer outra. Se não há um acordo, então o conflito prossegue.
O paradoxo é que é preciso, às vezes, perder para ganhar. No final das contas – ou no longo prazo – não haveria ganho de qualquer jeito, portanto, melhor perder agora e tentar de outra forma do que continuar perdendo… tempo…
Deixar ir
Neste texto – 7 benefícios da Mindfulness Psychology – eu trago o conceito de deixar ir (letting go). Deixar ir o que nos faz sofrer nem sempre é fácil – como vimos. Não porque sejamos masoquistas, mas porque o sofrimento tem um propósito, tem um “ganho secundário”.
É só pensarmos no que estamos constantemente reclamando. Se reclamar não vai mudar nada, porque reclamamos e focamos no que nos faz mal? Porque reclamar possui um ganho, seja a consideração alheia, seja ter o que falar, seja se fazer de vítima.
Um exercício interessante é anotar as reclamações, os problemas intermináveis e insolúveis, e observar o que estamos ganhando com eles. Por exemplo, alguém que reclama frequentemente do trânsito pode utilizar o trânsito como desculpa e justificativa para chegar atrasado em compromissos ou não ir.
A dificuldade de deixar ir é que para deixar ir o sofrimento temos que ser muito honestos. Honestos dentro de nós, menos do que fora. É preciso admitir a verdade, como:
“Este relacionamento está uma droga. Mas continuo nele porque acho que não vou conseguir nada melhor”
“Este trabalho não está rendendo e não vai me dar nem estabilidade nem segurança financeira. Mas eu tenho medo de tentar uma outra oportunidade. Já estou acostumado a trabalhar aqui…”
Conclusão
Culpar os outros, se faz sol ou se faz chuva, reclamar se o relacionamento, o trabalho ou o que for não vai bem, não vai mudar em nada. Tudo o que está fora é como o vaso do macaco, apenas uma forma externa. Continuar neste espaço, tentando encontrar o que não vai ser ali obtido, é uma perda de tempo.
Muito interessante a história do macaco, Mas em casos há pessoas que está vivenciando isso não porque quer mas por influência, por exemplo no trabalho,a pessoa não está se sentindo bem no que está, ai tem amigos ou familiares que dão concelhos e não apoia sair do trabalho e falam “-você vai precisar disso e daquilo”, mas não olha pelo lado sentimental e sim material, ai forma um mar de dúvidas na mente e acaba sofrendo duplamente por não ter apoio e não está mais se dando bem no trabalho.
Espero que entenda +/- o meu pensar Professor
Parabéns pelo texto!
Achei uma forma muito interessante e simples o uso do texto do macaco.
Depois de lido, dá para se fazer vários links com sentimentos afins que habitam a mente.
O ápice do sofrimento para muitas pessoas – e para mim, no momento- é sair da zona de conforto e entrar na zona de conflito, se é que esses conceitos não mudem após a mudança de vida.
Seus textos só aguçam a minha vontade de cursar psicologia.
Oi Rafaela, entendo!
Sugiro a leitura do nosso texto – Eu não estou aqui para satisfazer as suas expectativas
Obrigado Thomas!
Gostei bastante da interpretação feita pelo professor Filipe a maneira como explanou fez me dispertar da situação que meu irmão esta a viver. Continue assim um abraço.
Excelente! Como sempre esteve. Muito obrigado professor Felipe, por seu amor e dedicação a sua profissão e compartilhar conosco.
Bem interessante a explicação, já conhecia esta estoria, mas com a esta explicação ficou bem mais elucitativa, obrigada!
Excelente ilustração para um assunto tão profundo/complicado! A algumas semanas passei por isso… Grande dificuldade para admitir a verdade e me livrar do vaso que prendia a minha mão. Grande engano é pensar que aquilo que desejamos, só por ser nossa vontade, nos fará só bem. Óbvio que se não tiver razão, inteligência e não for pesado na balança do bom senso nosso querer nos leva a prisões. No ensinamento bíblico está: “Há um grave mal que vi debaixo do sol: as riquezas que os seus donos guardam para o seu próprio dano. (Eclesiastes 5:13)”. Em experiência própria descobri que existem outros cocos melhores do que está enfiado no vaso… Basta ter o trabalho de subir no coqueiro para apanhar (rsrsrs).
Professor Felipe gostei muito deste assunto e da explicação! Muito esclarecedor!
Estou vivendo uma situação semelhante à desse macaco. Preciso largar mão do sofrimento e partir em busca do que me faz feliz. Adorei o texto e reconheço que preciso de ajuda.
caro colega, entendo isso como uma modalidade de codependência onde o meu sofrimento justifica a minha necessidade afetiva (codependência afetiva) de agradar e até viver para terceiros, independente do retorno ou da qualidade da relação.
Olá, creio que houve um ato falho nesse texto, a palavra “vaso” com a semântica de recipiente é grafada com “s”, já “vazo”, é a conjugação do verbo vazar na primeira pessoal do singular, “…eu vazo”… E usada no sentido atual da gíria “vazar”, seria algo como “…eu vazo dessa situação!”. O “ato falho” é brincadeira minha, claro… mas é com “S”! Abraço
a palavra vaso é com s e não z.Minha intenção melhorar…
Muito bom!
Obrigado Paulo! Foi erro meu mesmo! Se fosse ato falho teria errado só em um e não em todos!!! rsrs
Desconfio logo de cara quando encontro um erro grotesco de grafia. Enfiou a mão no vazo. Vazo, vem do verbo vazar. O certo seria: enfiou a mão no vaso. Vazo é verbo, enquanto vaso é substantivo. Por isso, vazei.
Obrigado Marina! Agradeço a atenção! Acho que tinha muito tempo que não escrevia vaso e acabei ficando mais no sentido e sonoridade do que na correção ortográfica, rsrs
Olá José! Também podemos pensar por esse ângulo.
Veja o nosso texto – https://psicologiamsn20220322.mystagingwebsite.com/2014/08/dependencia-emocional-5-formas-para-ser-menos-dependente.html
Erros acontecem Samara! Aprendi a escrever com a técnica de escrever tudo o que vier e depois arrumar e corrigir, mas, neste caso – como acontece mesmo em grandes jornais – houve um erro. Errata publicada. Abraços
Adorei o texto, me identifiquei muito…vejo como é mesmo difícil sairmos dos nossos vasos diários.
Olá, caro professor Felipe!
Seu site é fantástico! Eu diria até que ele se parece com aqueles livros de auto-ajuda que mantemos ao lado do travesseiro, ( que eu adoro). Curso pós-graduação em psicologia clínica – psicanálise, e sou seu fã!
Eu sinto uma necessidade extrema de simplesmente comentar nos seus posts, você é um tipo de profissional que inspira qualquer futuro Psicólogo. Eu quero ser uma futura profissional tão bem qualificada quanto você. O texto veio exatamente na hora que eu precisava ( coincidência? haha), mas é algo que provoca um certo impacto e te estimula a mudanças. Você poderia escrever mais a respeito do Mindfulness? é algo tão interessante e tem tão pouco a respeito aqui no Brasil. Agradeço por ser tão atencioso com seus leitores e por está sempre disponibilizando algo novo, abraço!
Obrigado Beatriz!
Estaremos publicando sim!
Conheça também o nosso site só de Mindfulness, Arte e Meditação – Felipe de Souza
Adorei o texto. Gostaria de saber mais sobre esse assunto. Mas, a pergunta que fica é Como largar o coco que está no vaso? Rss ainda não sei a resposta.
Realmente tenho medo do ruim ficar pior. Sofro por medo de sofrer mais.
Acho também que, algumas pessoas não abandonam seus’ vasos” porque não forsm ensinadoa a isso.
Muitas são as reflexões. Eu mesmo estou fazendo a minha e tenho consciência de que preciso esquecer o vaso. E sei que falta coragem.
Por isso a terapia e bem vinda.
Oi Angélica!
Eu li uma frase muito interessante certa vez. Dizia assim: “o espírito do fogo está em busca do fogo”. O que significa que já temos dentro de nós o que precisamos, mas ficamos buscando fora.
Atenciosamente,
Felipe de Souza
sabemos qdo n esta nos fazendo bem,e devemos n desistir,mas seguir em frente,com uma nova tentativa ou uma nova experiência,o novo q nos faz ter medo,certo ou n vc tentou, e uma hora encontrará o q te completa,colocamos desculpas em tudo e em todos,mas a decisão e so nossa,so nos falta a coragem de mudar e n desistir,esse e meu pensamento…
Olá! Gostei muito do texto e da história do macaco, como tantas outras que vc já escreveu, sempre muito claro e instrutivo. Só tenho a agradecer hj e sempre, muito obrigada!!!
Só que ao ler seu pensamento sobre o paradoxo, quando vc diz que fica pensando pq o macaco não solta o coco e vai procura-lo em outro lugar, ou pq não vira o vaso para que o coco caia, surgiu uma dúvida na minha cabeça em relação à virada do vaso.
Explico: se compararmos o vaso com o problema ou dificuldade, como vc diz no início do texto, ao virar o vaso o coco cairia, logo, o desejo se realizaria. Mas na vida prática, como poderíamos “virar o vaso” para que o desejo se realizasse? Só vejo a possibilidade de largar o coco e procura-lo em outro lugar, entende?
Obrigada pela atenção e sucesso, sempre!!!
Oi Cida,
É que porque se o coco entrou tem que sair do vaso. Sai, se o macaco procurar tirar sem ser com sua mão, rsrs. Bem, pelo menos é uma ideia.
Virar o vaso de cabeça pra baixo significa ver a situação por uma outra perspectiva, por um outro ângulo. Como se diz em inglês, pensar fora da caixa.
Atenciosamente,
Felipe de Souza
muito bom
Adorei o texto e me identifico muito com o macaco alias posso dizer que estou com a mão dentro do vaso tentando tirar o coco já a 06 anos (relacionamento homoafetivo) quando comecei a ler foi muito surreal porque eu pensava em diversas maneiras para o macaco resolver seu problema uma delas inclusive não foi citada por ninguem que era a de que o macaco poderia quebrar o vaso e pegar o que tanto queria. Mas enfim quando se trata de mim fico cega e não vejo soluções, talvez Prof. O Senhor possa me esclarecer a solução que escolhi para o macaco a de quebrar o vaso, o que ela representa aos teus olhos. Obrigado e parabéns.
Olá Talita!
É uma solução interessante! O problema é que depois de o vaso estar quebrado, ficarão muitos cacos para limpar…
Atenciosamente,
Felipe de Souza
E se a pessoa nem quer o coco? Digo pela metáfora contada. E se nem vontade de pegar o coco ela tem? O que fazer?
Olá Larissa,
Não querer nada, para algumas pessoas e em alguns momentos, é associado com o máximo de felicidade. Sabe quando tudo dá incrivelmente certo e pensamos: “tudo está perfeito… não preciso de mais nada?”
Atenciosamente,
Felipe de Souza
Interessante a reflexão, acrescento apenas a possibilidade do apego ao problema por uma questão de instinto de sobrevivência.
Talita Ferreira, também pensei na possibilidade de “quebrar o vaso”… e acho que foi isso que fiz recentemente… Resultado: racionalmente, sei que fiz o melhor pra mim e que sim, uma hora a dor vai passar, mas olhar pros cacos…. e aceitar que foi eu quem escolheu assim fazer… não está sendo nada fácil!! Detalhe: foi um relacionamento homoafetivo também. Prof. Felipe, foi a primeira vez que entrei aqui, parabéns pelo texto.
Obrigado Giulianna!
Nossa excelente texto!
E agora estou um tanto confusa, me vejo na situação do macaco e consigo sentir o sofrimento, consigo sentir o desejo até mesmo a esperança de que se deixar as horas passar mesmo que do jeito errado eu iria conseguir tirar o coco do vaso!
E oque conclui é que sou um macaco esperançoso, que eu acredito naquilo que busco e que mesmo com dificuldades eu também acredito na possibilidade do coco querer ou se deixar sair do vaso!
mas oque me pergunto é errado ser assim? acreditar em mim? acreditar nas possibilidades? nas coisas ou situações?
Mesmo por que o macaco já conhece, já está sentindo dor, então ele pode não ligar com outras dores.
talvez o macaco não quer outros caminhos, talvez ele somente quer continuar acreditando demais em tudo e todos!
Olá Camila,
A ética (a área da filosofia que trata as escolhas que fazemos para encontrarmos a felicidade) tem várias vertentes. A seu modo, a psicologia também está ligada à ética, quando sai do conhecimento produzido, por exemplo, em laboratórios e testes para a aplicação prática.
A grosso modo, podemos dizer que não existe uma resposta final sobre a ética. Cada um tem que encontrar a sua própria ética, fazer as suas escolhas e procurar encontrar (ou saber) o que quer. Por isso, não dá para dizer que é uma coisa certa ou errada fazer isso ou aquilo. Porém, alguns caminhos certamente conduzem a um maior sofrimento, dá até para “prever”… sobre este aspecto que trata esse texto.
Atenciosamente,
Felipe de Souza
Meus parabéns! Ótimo
Obrigado!