A personalidade total ou psique, como é chamada por Carl Gustav Jung, consiste de vários sistemas isolados, mas que atuam uns sobre os outros de forma dinâmica.
A visão junguiana sobre a personalidade muitas vezes é comparada com a teoria psicanalítica de Freud, pela enfase que a psicologia junguiana dá ao inconsciente. No entanto, as diferenças parecem ser maiores do que as semelhanças.
Os principais sistemas correspondem, na psicologia analítica de Jung, ao ego, ao inconsciente individual e ao inconsciente coletivo, à persona, à anima ou animus, e à sombra. Tais elementos, como um todo, formam a personalidade total ou Si-Mesmo (em alemão Selbst, e em inglês Self).
O ego ou eu é o responsável pela identidade e continuidade, e é encarado, do ponto de vista da pessoa, como sendo o centro da personalidade. Também é denominado mente consciente ou consciência e é constituído de percepções, memórias, pensamentos e sentimentos conscientes.
Contrapondo-se à consciência há o inconsciente, que é dividido em duas regiões: o inconsciente individual e o inconsciente coletivo.
No livro Aion, estudos sobre o simbolismo de Si-Mesmo, Jung escreve: “os conteúdos do inconsciente pessoal são aquisições da existência individual, ao passo que os conteúdos do inconsciente coletivo são arquétipos que existem sempre e a priori”.
O inconsciente individual é uma região adjacente ao ego, e consiste de experiências que foram reprimidas, suprimidas, esquecidas ou ignoradas. Tais conteúdos são acessíveis à consciência, e há muitas trocas de conteúdos entre este e o ego.
Os conteúdos do inconsciente coletivo são arquetípicos, ou seja, são inatos, de natureza universal e são os mesmos em toda a parte e em todos os indivíduos. O termo arquétipo não tem por finalidade denotar uma ideia herdada, mas sim um modo herdado de funcionamento psíquico.
Os arquétipos que se caracterizam mais nitidamente são aqueles que mais frequente e intensamente afetam o eu. São eles: a persona, a sombra, a anima e o animus.
A persona é a máscara usada pelo indivíduo em resposta às solicitações da convenção e da tradição social e às suas próprias necessidades arquetípicas internas. O conceito se refere às máscaras (persona) usadas pelos atores na Antiguidade grega, em peças ritualísticas solenes. Corresponde como imagem representacional do arquétipo de adaptação, pois somente através da persona é que o indivíduo consegue se adaptar ao mundo.
Uma persona mal-formada é tão limitadora quanto uma rígida demais. No último caso, o ego se confunde com a persona, assim sendo, a pessoa em questão se identifica com a posição social que representa e somente com esta.
E no outro oposto, quando a formação do indivíduo é inadequada devido a um treino social insatisfatório ou à rejeição das formas sociais, este não consegue ou se recusa a representar os papéis sociais que lhe são destinados.
Há um relacionamento de oposição entre a persona e a sombra.
“A sombra – escreve Jung, no já citado livro – constitui um problema de ordem moral que desafia a personalidade do eu como um todo”, pois a sombra apresenta “aspectos obscuros da personalidade”.
Portanto, quanto mais clara a persona, mais escura será a sombra. Quanto mais identificação houver entre o que se representa no mundo mais repressão haverá em relação aos elementos que não se coadunam com tal representação.
Em relação aos arquétipos da anima e do animus, Jung escreve que aparecerão personificados em sonhos, visões ou fantasias, ou seja, representarão personalidades inconscientes com os quais o ego deverá lidar.
A anima e o animus são arquétipos daquilo que, em cada sexo, é o inteiramente oposto. A anima constitui no homem as qualidades femininas, e o animus, na psique da mulher, as qualidades masculinas.
A anima, como imagem numinosa, ou seja, coo imagem afetiva espontaneamente produzida pela psique, representa o feminino eterno. É a mãe, irmã, amada, destruidora, donzela, bruxa… Enfim, a anima é, para o homem, tudo o que uma mulher pode ser.
A mulher é compensada pela natureza masculina, o animus, que significa razão ou espírito.
“Como a anima corresponde ao Eros materno, o animus corresponde o Logos paterno” – escreve Jung no livro Aion.
Para se alcançar a totalidade, se faz necessário, como pré-requisito indispensável, defrontar-se com a anima ou com o animus, a fim de alcançar uma união, um “coniunctio oppositorum”, uma unificação dos opostos.
“Embora a totalidade, à primeira vista, não pareça mais do que uma noção abstrata (como a anima e o animus), contudo é uma noção empírica, antecipada na psique por símbolos espontâneos ou autônomos. Entre estes símbolos, podemos citar em especial os símbolos da quaternidade, de circularidade e os que forma mandalas (formas circulares geométricas).
O processo de individuação liga todos os sistemas (ou partes) da psique até agora definidos.
No livro O eu e o inconsciente, Jung circunscreve o processo do seguinte modo: “há uma destinação, uma possível meta além das fases (ou sistemas). Individuação significa tornar-se um ser único, na medida em que por individualidade entendermos nossa singularidade mais íntima, última e incomparável, significando também que nos tornamos nosso próprio Si-Mesmo. É o realizar-se do Si-Mesmo”.
A psicologia analítica de Jung, que é muitas vezes comparada com a teoria psicanalítica, tanto por suas semelhanças como por suas diferenças, só pode ser ligada à esta na medida em que pese a influência mútua entre Jung e Freud, com a colaboração inicial e a separação posterior.
Em relação à influência de Freud, podemos pensar no método de análise de sonho, que Jung também modifica, mas que em sua essência deve muito ao criador da psicanálise – o que Jung reconhece.
Este exemplo é só para citarmos uma influência e ao mesmo tempo uma divergência. Evidentemente, poderíamos citar muitos outros exemplos.
Embora Jung seja considerado muitas vezes um místico – por estudar os símbolos de muitas religiões – ele se auto-considerava um empirista, um cientista que trabalhava com material psíquico produzido e que poderia ser visto, descrito e comparado.
Apesar disso, ele criticava a linguagem científica abstrata na psicologia, que “muitas vezes corteja a opinião segundo o qual suas intuições poderiam ser substituídas por equações algébricas”.
Como vimos, o objetivo de uma terapia, na abordagem da psicologia analítica ou junguiana, é o processo de individuação, no qual o paciente “confrontando-se” com o seu próprio inconsciente, tanto o coletivo, quanto o pessoal, chegará a ser a sua própria totalidade, chegará à plenitude, ou seja à sua personalidade total.
Portanto, podemos concluir que o conceito de personalidade para Jung não pode ser reduzido ao termo persona (persona+lidade), pois a persona é apenas um dos elementos que constituem a personalidade total, que, em psicologia analítica, então, só pode ser considerada se o for em sua totalidade.
Para isso, temos que estudar todos os conceitos e a “geografia psíquica” junguiana.
Post muito interessante! Irei começar a faculdade de psicologia e sempre me identifiquei muito com a abordagem de Jung. Espero poder optar por mais disciplinas que estudam as obras de Jung.
Olá João,
Infelizmente a obra de Jung não é muito estudada nas faculdades.
Para você ter uma ideia, a USP possui apenas uma única professora, a Laura Villares, especializada em Jung.
Temos também o Curso Jung, caso lhe interesse.
Atenciosamente,
Felipe de Souza
Gostei muito! faço faculdade de psicologia e sempre me identifiquei muito com a abordagem de Jung.
Olá Márcia!
Então fica o convite para estudarmos junto Jung através de Vídeo-Aulas – Acesso a todos os vídeos de todos os Cursos
Estamos estudando em profundidade as suas obras completas.
Atenciosamente,
Felipe de Souza
Felipe,
Que bom que te encontrei,estava em busca de conhecimento sobre Jung, fiz curso de psicanalise integrativa e Jung é meu foco. Quero fazer o curso.Obrigada pela postagem e desprendimento e parabéns pelo jeito claro e simples de sua abordagem
Olá, gostaria de saber se pode me indicar um livro onde eu possa me informar melhor sobre a ideia de personas, me ajudaria muito em meu TCC. Estudo design e pensei em fazer um cruzamento de Semiotica e a psicanalise.
Obrigado.
Olá Rafael,
Recomendo o livro Aion, simbolismos do Si-mesmo e Psicologia do Inconsciente, e também o Eu e o Inconsciente, de C. G. Jung.
Atenciosamente,
Felipe de Souza
boa tarde professor parabens prlo site tenhouma duvida ,como e que se forma a peronalidade segundo o jung
Olá Mario,
Esta é uma excelente questão!
Em resumo, podemos dizer que a personalidade se forma por razões filogenéticas (próprias da espécie) e por razões ambiente (convívio familiar, social) e por decisões do ego.
Atenciosamente,
Felipe de Souza
Ola Felipe. Primeiramente, parabéns pelo ótimo site!
Segundo, sou aluna do 1º ano de Psicologia, e fiquei com duvida dessa parte: “Uma persona mal-formada é tão limitadora quanto uma rígida demais. No último caso, o ego se confunde com a persona, assim sendo, a pessoa em questão se identifica com a posição social que representa e somente com esta.” – Ou seja, o indivíduo que possui uma persona muito rígida se identifica com o ego e nao conhece seu eu? Ela não poderia ter um grande conhecimento do seu lado mais oculto e assim, conduzir seu ego de forma semelhante?
Muito obrigada desde já.
Oi Tamires,
O exemplo clássico de alguém que se identifica com a persona é do general que é general em todos os lugares. Sua persona é excelente para o trabalho no exército mas para sua família e amigos será um suplício. Também vemos casos extremos nos quais uma pessoa se identifica tanto com sua persona na profissão que, ao aposentar, morre. Isto porque sua vida inteira era o seu trabalho.
O problema oposto, de não desenvolver nem uma persona, seria aquele indivíduo que é tão ele mesmo que não consegue conviver com ninguém. A palavra idiota, no grego antigo, queria dizer exatamente isso: aquele que é muito ele mesmo. Por ser tão ele mesmo e não ser importar com os outros (ter “pouca” persona) acaba sendo um idiota no sentido moderno.
Atenciosamente,
Felipe de Souza
SOU DA UFMG , MÉDICO E ESTOU FAZENDO AGORA PSICOLOGIA. SEU TRABALHO E CONTEÚDOS SERÃO MUITO UTILIZADOS POIS SÃO MUITO BONS E MERECE SER APRECIADO, E SEMPRE PESQUISADOS.
T Y M
Olà Felipe ,quero te agradecer pelo seu site .estou fazendo o curso de psicanalise ,estou no primeiro modulo e me , identifiquei muito com jung quero me aprofundar mais em jung.
Oi Felipe, gosto tanto desse site, de tudo, dos textos, dos vídeos e dos comentários dos colegas tb. Estou pensando em comprar alguns cursos. Estou iniciando o 4º semestre de Psicologia e estou percebendo que vou ter problemas p me decidir sobre qual psicologia me especializarei. Gosto da teoria de Jung, de Carl Roger, Que dica você me dar para que eu não fique com tantas dúvidas? Melhor, quais critérios devo levar mais em consideração? Obrigada.
Olá Sueli!
Bem, eu gosto muito da dica do Gaiarsa, um dos maiores psicoterapeutas aqui do Brasil. Ele dizia que pegava um autor por ano para se aprofundar. Evidente que ele acabou escolhendo mais o Jung e o Reich, mas, mesmo assim, ele sempre fez e continuou fazendo isso. Um autor por ano.
Atenciosamente,
Felipe de Souza
Felipe já faz anos que acompanho seu site.
Ano passado dei uma aula no ensino médio com o seu material e os alunos me cobraram muito, pois adoraram o conteúdo.
Agora estou trabalhando como terapeuta holística estudo bastante sobre Jung e sempre venho no seu site.
Grata!
Olá Diana!
Obrigado!
Fico muito feliz que o site esteja sendo útil!
Será sempre um prazer contar com sua participação por aqui!
Atenciosamente,
Felipe de Souza
Professor Felipe, estou iniciando o curso online grátis, sou psicóloga e atuo em consultório particular desde 2000, sigo a abordagem sistêmica e hoje estou interessada em conhecer mais sobre a terapia yunguiana, obrigada por este curso.Grande ab.
Olá, pode passar a referencias para ele poder ser utilizado num artigo academico?
Maeli, existe um modo padrão de citar artigos publicados Online, ok. Verifique como funciona em sua instituição de ensino.
Bom dia Prof Felipe, trabalho como psicóloga em um serviço de assistência social, com atendimento a famílias em situação de violação de direitos, diversas violências, você poderia me recomendar alguma leitura dentro da psicologia junguiana que poderia me ser útil?
Obrigada!
Olá Cintia! Infelizmente não sei te dizer algo específico. Em situações em que trabalhamos nessa área, normalmente existem tantas demandas para além do atendimento psíquico que talvez fosse útil dar uma olhada na psicologia social e comunitária. O que você acha? Abraços
Achei interessante este post, mas não aprofundou como esperei o conceito de personalidade em Jung.
Oi Fabio! É um texto introdutório mesmo. Temos mais materiais sobre Jung aqui no site. E se você quiser se aprofundar, pode ler minha tese de doutorado sobre o Livro Vermelho na UFJF.