A violência silenciosa.

Autor: Prof. Dirceu Moreira

Quem semeia um pensamento colherá um fato; semeia um fato e terá um hábito; semeia um hábito e formará um caráter; semeia um caráter e obterá um destino.

Prof. Henrique José de Souza (1883-1963).

Vou situar algumas informações e basear-me na experiência de consultório de forma bem resumida. É lá onde percebo os estragos no assediado. Ao semear ventos, hoje colhemos a tempestade, tal a frase do Prof. Henrique é perfeita para refletirmos, sobre o mundo que criamos. Sair em busca de culpados e caça as bruxas, você poderá acabar sendo presa de si mesmo. Muita coisa precisa ser feita, principalmente na área de educação, onde começo a perceber a sensibilidade dos professores, escolas, secretarias de educação no sentido de priorizar mais a preparação do seu pessoal nas competências humanas.

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Introdução

Na Internet você encontra uma gama de artigos, livros, reportagens e etc., sobre este assunto. Esta violência silenciosa está começando a fazer barulho, no momento em que está pesando financeiramente no bolso das instituições, porque esta infelizmente, é a linguagem que se entende, fruto de um capitalismo neoliberal burro, que não consegue perceber que o lucro, desenvolvimento e progresso estão no investimento que ela faz no CAPITAL HUMANO. Este caminho inicia-se na EDUCAÇÃO.

Alguns programas de tv reconstroem, casas, carros velhos, e até mesmo rostos humanos, mas não vi nada na reconstrução de uma escola, porque reconstruir o homem pela educação, reconstrói seu caráter e lhe restitui a dignidade. Se o montante que se aplica no futebol e outras tantas modalidades de esportes, fosse destinada à educação apenas uma pequena parcela deste investimento, não teríamos nenhum criança fora da escola, nem escolas destruídas, nem professores mal pagos e desmotivados. Parece que a ignorância interessa a poucos que manipulam muitos, porem, os tempos são chegados e não há como retroceder. Toda humanidade está condenada à evolução, porque essa é a lei universal de evolução, só que está lei anda de braços dados com a educação. Quer queiram ou não, o homem está saindo do seu cativeiro pelo advento de um novo tempo e um novo estado de consciência.

O estado perde R$ 520 milhões, anualmente… “Isso representa um terço de todo o custeio das universidades públicas do país” (texto integral: www.sinal.org.br/). No livro Assédio moral no trabalho, capitulo 10, do adv. dr. Robson Zanetti consta: EUA gasta com tratamento da depressão 44 bilhões de dólares segundo o BIT – International Labour Office, ligado a ONU (Bureau international du travail). Um gestor educacional com este mesmo olhar, pode muito bem dizer: aluno dá lucro e professor despesa e em uma empresa: o produto dá lucro e funcionário despesa ou até prejuízo. Uma verdadeira inversão de valores, pois, o capital humano é decapitado da suas qualidades em detrimento da quantidade.

Histórico: precursores do assédio moral, dr. Klaus Niedl, da Universidade de Viena, autor da primeira tese de doutorado sobre o mobbing, dr. em psicologia do trabalho, Heiz Leymann, pela médica Marie-France Hirigoyen, pelo italiano Harald Ege e pelo alemão Dieter Zapf. No Brasil a partir de 2000 pela dra. Margarida Barreto, fruto de suas pesquisas, que culminou com o lançamento do livro. Violência, Saúde e Trabalho: Uma Jornada de Humilhações. Consta no livro dos recordes- Rank Brasil que o primeiro livro sobre assédio moral foi do prof. Mestre João Renato Alves Pereira, que também é autor da 1ª lei no Brasil (Iracemópolis-sp) sobre assédio.

Definição de assédio: É a exposição do trabalhador (a) a situações humilhantes e constrangedoras, repetitivas e prolongadas durante a jornada de trabalho e no exercício de suas funções (www.assediomoral.org) . Recebe também outros nomes como bullyng, psicoterrorismo, tiranizar, mobbing, ostracismo social. Em outras palavras: deterioração dos valores humanos e consequentemente perda da dignidade.

Tipologia do assédio moral:

Na posição vertical descendente o assédio ocorre do professor para o aluno, numa relação hierárquica, tal qual nas empresas chefia x subordinado. Na primeira sessão de terapia, meu cliente disse: estou de afastamento e por recomendação médica, procurei a terapia, porque não suporto mais meu trabalho. Tenho medo de voltar e ser novamente discriminada pela minha chefia. Transtorno visível: depressão, desanimo e baixa estima.

Já na posição vertical ascendente ocorre assédio a partir do aluno (s) para o professor. Este é um tipo de assédio que vem aumentando (veja o Projeto de lei de Paulo Pain). No consultório um cliente fez o seguinte comentário: aquele fulano me paga (se referindo a seu chefe), porque agora meus colegas estão do meu lado. É importante que o líder tenha consciência que o poder também vem de baixo. Formigas você vê, porem o cupim age às escondidas e, o estrago é maior. Infelizmente está aumentando o número de aluno ir contra o professor, porém, o mais comum é unir-se a outros e provocar o assédio.

Na posição horizontal x horizontal, estão as relações com seus pares (prof. x prof.) e ai corre por conta as fofocas e o diz que diz. Não tolero mais minha escola, relatou-me uma professora, porque na maioria das vezes me sinto discriminadas no horário dos intervalos e café com meus colegas. Importante: nem todos estes casos podem ser enquadrados como bullyng.

Os outros 4 tipos constituem tipos variantes, que merecem cuidado especial para uma boa “ouvidoria”. Na posição 4 aluno contra aluno é o mais comum e denominado de bullyng que é outra forma de dizer assédio. Na posição 5, um prof. se une a outro (os) contra o aluno. Na posição 6 parábola invertida, o aluno se une a um prof. contra outro aluno. Já na posição 7 parábola o prof. se une a um ou mais alunos para atingir um colega, Penso que os casos 6 e 7 sejam pouco comuns, mas é preciso vigilância dos sentidos. A MELHOR MANEIRA DE RESOLVER A QUESTÃO DO ASSÉDIO É A CONSCIÊNCIA HIERARQUICA E TAMBÉM DO PAPEL PROFISSIONAL. Isto não pode ser cobrado apenas do professor, mas também do aluno, funcionários da escola e dos pais . Têm pais que criam seus filhos para serem bonzinhos e obedientes em casa, porém, quando o professor relata exatamente o contrário, os pais se rebelam e os ofendem moralmente. Este assunto ainda vai dar muito pano para camisas até que acontecer o primeiro caso que caracterize assédio com indenização, no entanto, para que isso não aconteça, o estado tem que estar mais sensível para estes tipos de acontecimentos, implantando uma ouvidoria imparcial para educadores e educandos. O corpo discente, funcionários, docente, estão ficando doentes. As indenizações individuais já atingiram a casa de dois milhões de reais. Pense em centenas de processos de educadores, alunos, pais e funcionários contra as escolas, secretarias e governo. Pode ser muito dinheiro, mas a dignidade humana não tem preço.

É importante salientar que esta tipologia que exemplifiquei professor x aluno, também se aplica aos cargos de coordenação, direção, pais, secretaria e para o próprio governo. O assédio não é uma forma de ganhar dinheiro, é um fato e como tal tem que ser provado.

As estratégias: o assediador manipula seus subordinados/alunos de três formas: 1º. Fazendo papel de vítima para que estes se sintam culpados (veja só minha situação: eu ensino, mas você não aprende. Em outras palavras a culpa é sua); 2º. Ser o salvador, agindo como bonzinho e com isso compra ou suborna-os (presentes, pseudos elogios), e 3º. Age como perseguidor e se impõe pelo medo (coage e ameaça: se isto acontecer novamente….).

Conseqüências: desmotivação (burnout), baixa estima, doenças decorrentes da somatização (principalmente a depressão), internação, afastamento ou perda do emprego, perda da identidade profissional e pessoal, ou até à morte (doenças ou suicídio). Quando o governo fizer um levantamento total dos reais motivos das doenças provocadas pelo assédio moral, que causa afastamentos, internações, pré-aposentadoria na área de educação, vai sentir no bolso e espero também que na consciência, o quanto vale o assédio. Todo profissional da área de educação deve estar atualizado quanto a este assunto para não ser apanhado de surpresa.

As leis: Lei Nº 4.742, de 2001 – CLT-artigo 483, Lei Nº 9.394, Constituição de 1988 e etc., caso contrário na caberia neste artigo. É preciso tomar muito cuidado com as reivindicações dos direitos, sem antes conhecer os deveres. Os dois pratos da balança devem estar em equilíbrio, não é só professor que é assediador, veja o projeto de lei do senador Paulo Pain – pt-rs – Configura violência contra o professor qualquer ação ou omissão, decorrente no exercício profissional, que cause morte, lesão corporal ou dano patrimonial, praticado direta ou indiretamente por aluno, seus pais, responsáveis legais ou terceiros.

Fico pensando onde fomos parar: temos leis de proteção da criança e adolescentes, dos idosos, da mulher, dos discriminados, dos animais, ambiental, dos direitos disso e daquilo. Vamos então propor uma nova lei, a Lei da proteção do homem contra o homem, e neste caso somente Deus poderá fazer cumpri-la. O pramanta que deve ser o novo estado de consciência da humanidade é expresso por um dispositivo que produz o renascimento através do fogo, a centelha primordial. E este fogo, expressando a inteligência está dentro de cada ser humano, somente pode ser desperto através do conhecimento, cuja detentora desde os primeiros passos está nas mãos da educação. Se ela ficar doente, toda sociedade adoecerá, aliás, esta sociedade somos nós mesmo.

Há uma palavra, que resume tudo isso: Namastê: o Deus que habita em mim saúda o Deus que habita em você. Essa é máxima dos relacionamentos, e talvez seja o programa que cada escola e instituições tenham que ter como meta de suas ouvidorias.

Quanto custa o assédio: não basta identificar este custo só no financeiro, mas também sob o ponto de vista da “perda de identidade”, da doença psicomental, da exposição do ser humano e sua família perante a sociedade. Algumas instituições já estão criando o seguro assédio, isto significa uma ação paliativa e não corretiva, numa melhor preparação e consciência do papel profissional tanto dos seus líderes quando dos liderados. O caso recente de abuso com crianças em uma creche veiculadas pela imprensa foge aos parâmetros da normalidade e constitui crime, principalmente contra indefesas crianças. Só podemos dar o que temos, e uma criança não tem maturidade suficiente para se defender.

Tipos de Escolas-instituições e plano de ação anti-assédio (bullyng):

1. Reativas, são aquelas que reagem e respondem aos casos de assédio moral quando eles já ocorreram, porém não solucionam o problema. Sua ouvidoria é surda, só escuta.

2. Ativas, são aquelas que fazem um trabalho corretivo pela orientação e as cicatrizes são amenizadas. Sua ouvidoria ouve, mas não registra os fatos.

3. Proativas, são aquelas que possuem um plano que envolve uma ação corretiva imediata dando apoio e suporte psicopedagógico para os envolvidos em corresponsabilidade com a família, e se for o caso, sugere o encaminhamento psicológico e depois estabelece estratégia preventiva, para que o fato não se repita. Sua ouvidoria ouve, acolhe, repassa as informações e acompanha a solução do caso.

Não estou me referindo a ouvidoria apenas no sentido convencional, mas que cada um dos colaboradores de uma escola/instituição tenham ouvidos para ouvir e olhos para ver o que acontece no ambiente de sala de aula e do espaço escolar. No site do governo de Alagoas consta: “Ouvidoria nas Escolas contempla mais de 45 mil alunos e educadores”.

Estive recentemente na Niplan Engenharia realizando algumas palestras sobre o papel ético do líder e as questões do assédio moral, iniciativa esta que serve de exemplo do que é ser uma empresa empreendedora, ao tomar uma ação preventiva, e implantar sua própria ouvidoria, como já o faz a Petrobrás.

O governo nas suas instancias municipal, estadual e federal, já possuem sua próprias ouvidorias, como muitas faculdades, escolas, empresas e etc., porém existem muitas que ainda que não têm um canal especifico para atender os diversos tipos de assédio. Com estas questões do assédio moral (bullying) a ouvidoria passa a ter um papel fundamental para uma ação preventiva, tanto daquele que é o assediador quanto daquele que é assediado. Nem professor, nem chefe precisa ser vilão, nem muito menos o aluno ou funcionário, cabe apenas ter consciência do seu papel profissional.

Para mim, estudar é trabalho e profissão. Há tempos atrás quando se preenchia uma proposta de emprego era comum, no item profissão, escrever-se: estudante. Então, o processo é de mão dupla, corresponsabilidade professor x aluno, escola x família, empresa x funcionário. É preciso alteridade (rapport, empatia) por ambas as partes, sabendo se colocar no lugar do outro na relação interpessoal, porém antes disso é preciso competência intrapessoal (autoconhecimento). Abuso de poder outorgado mediante posição hierárquica não é o mesmo que liderar.

Para terminar quero dizer que o professor consciente do seu papel não precisa do poder manipulador do assédio moral (bullying), porque já é detentor do maior de todos os poderes: o conhecimento. O aluno principalmente no ensino infantil e fundamental refletem em grande parte o modelo da família e como é educado. Assim, compete aos pais, cuidarem melhor de suas sementes, para não se dar àquilo que está expresso inicialmente na frase do prof. Henrique: colhemos o que plantamos. A educação precisa, de uma sólida e comprometedora coparceria da escola com a família, para poder cumprir seu papel na potencialização do capital humano,

Autor: Prof. Dirceu Moreira – 12/46 – Psicólogo, pedagogo, Dr. honoris causa em psicologia das relações humanas, palestrante, consultor em potenciais humanos na educação e rh, autor de 11 livros. www.dirceumoreira.com.br – contato@dirceumoreira.com.br – S.André – sp