Culpar as outras pessoas por nossa situação atual é um comportamento que a gente aprende e pode manter a vida toda: “A culpa é dele”, “a culpa é dela”, pai, mãe, presidente, não importa quem, a culpa é atribuída a outra pessoa.

Na terapia, sabemos que existe um processo de desenvolvimento: é normal que primeiro se fale muito sobre os outros e muito sobre o passado. Depois, se fala mais sobre o eu e sobre o presente. (Quem quiser saber mais sobre este processo pode ler o livro de Carl Rogers, Tornar-se pessoa).

Isso significa então que a culpa é minha? A culpa é do eu e não do outro? De quem é a responsabilidade?

Bem, a vida é muito complexa e variada para fazer suposições e afirmações que seriam válidas para todos, em todos os casos. Entretanto, visando ficar bem, ter mais bem estar e flexibilidade psicológica, podemos refletir sobre alguns pontos:

1) O passado já passou

Se deixarmos as memórias de lado, por alguns minutos, onde estará o passado? Aquilo que atormenta a mente, aquilo que foi feito e dito (por mim e pelo outro), aonde está senão na própria mente?

Lidar com o passado é muito importante em uma terapia. Certas terapias, como a psicanálise e a terapia do esquema, focam mais no passado do que outras. O famoso texto de Freud, “Recordar, Repetir, Elaborar” já dá no próprio título um resumo da lógica do tratamento. Muita gente precisa lembrar do passado, repetir (talvez em palavras, talvez em atos ainda) até elaborar e seguir em frente.

É possível lidar com o passado também aprendendo a ficar mais no presente. As terapias cognitivo comportamentais de terceira onda que utilizam Mindfulness (atenção plena ao momento presente) ajudam nesse treinamento. Ficar mais no presente é ficar menos viajando na mente para o passado.

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2) A parte que cabe de responsabilidade a cada um

Existe uma técnica dentro da terapia cognitiva processual que consiste em pensar sobre a responsabilidade de cada pessoa em uma determinada situação. O terapeuta vai ajudando o paciente a ressignificar uma atribuição exagerada a si mesmo.

Por exemplo, um paciente se culpa porque autorizou a cirurgia da mãe e a mãe, infelizmente, veio a falecer. A culpa e o arrependimento faz então o paciente acreditar que 100% da responsabilidade é sua. Na sequência, o terapeuta vai auxiliando para que essa cota de 100% diminua. Há a responsabilidade do médico, por exemplo, e da própria mãe, que nunca havia cuidado da própria saúde. Além disso, outros eventos e pessoas também de forma direta ou indireta contribuíram para o resultado (inclusive o vírus que levou à infecção, o sistema imunológico, etc).

Esta técnica pode ser muito útil em certos casos em que a culpa é um grande problema. Seria como usar a lógica de atribuir culpa a si, diminuir o fardo da responsabilidade exagerada, questionando os pensamentos e crenças relacionados. Para outras pessoas, somente questionar o próprio pensamento e as evidências deles já pode ser suficiente.

O exemplo que dei acima foi talvez um pouco extremo. Podemos pensar no caso de alguém que se culpa por ter perdido o emprego. Existem muitos fatores que contribuem como fatores econômicos e sociais mais amplos, o mercado em que a empresa se encontra, além do chefe, e muitas outras pessoas mais, talvez.

Uma outra forma de refletir sobre a questão da responsabilidade e culpa é o trabalho de Byron Katie. Ela diz o seguinte:

“Posso apontar apenas três tipos de assuntos no universo: os meus, os seus e os de Deus. (Para mim, a palavra Deus quer dizer “realidade”. Realidade é Deus, porque ela governa. Tudo aquilo que está fora do meu controle, ou do seu controle, ou do controle de todos os demais, eu chamo de assuntos de Deus.

Muito de nosso estresse surge por vivermos mentalmente conectados com o que não é de nossa conta. Quando penso: “Você precisa arranjar um emprego, quero que você seja feliz”, estou entrando nos assuntos que são de sua conta. Quando me preocupo com terremotos, enchentes, guerra ou com a data da minha morte, estou me envolvendo nos assuntos de Deus [a realidade].

Se, mentalmente, envolvo-me com os seus assuntos ou com os assuntos de Deus, o resultado é a separação. Percebi isso no início de 1986. Quando, mentalmente, interferia nos assuntos de minha mãe com pensamentos como, por exemplo: “Minha mãe deveria me compreender”, imediatamente tinha uma sensação de solidão. E compreendi que todas as vezes na minha vida em que me sentira magoada ou solitária é porque estava envolvida no que era da conta de outra pessoa. Se você está vivendo sua vida e eu estou mentalmente também vivendo sua vida, quem está aqui vivendo a minha?”

Byron é uma autora fantástica, recomendo a todos! Os efeitos do trabalho vem sendo estudados em algumas universidades americanas. As evidências apontam para diminuição de sintomas de depressão e ansiedade após o trabalho.

3) Daqui para frente

Uma outra forma que pode ajudar na questão da culpa e vitimização é olhar para o futuro. As coisas podem estar difíceis agora, mas quase sempre dá pra fazer alguma coisa positiva para ir mudando a direção da nossa vida, não?

Podemos começar uma terapia, a fazer exercícios físicos (mesmo uma caminhada diária já é muito benéfico para a saúde física e mental), podemos começar um curso, ler um livro com boas ideias e que seja motivador, podemos cultivar a espiritualidade (que também contribui para a saúde mental). Enfim, mesmo que seja aos poucos, devagar, dentro do possível agora, sempre, quase sempre, dá pra começar já hoje.

Nesse sentido, podemos escolher uma área da vida e começar por ela: finanças, saúde, relacionamentos, trabalho… e começar!

Gosto do pensamento de Tony Robbins que diz que a gente pensa que dá pra fazer muito em um ano e a gente subestima o que dá pra fazer em dez anos. Ou seja, talvez em um ano não tenhamos mudado muito, mas em dez anos podemos fazer grandes progressos. De fato, em dez anos a vida pode estar totalmente diferente! E melhor!

O que você acha?