Neste texto, vamos apresentar a Terapia da Compaixão ou a Terapia Focada na Compaixão, conforme proposta pelo psicólogo Paul Gilbert. Primeiro, vamos entender o que significa compaixão e depois veremos os princípios fundamentais desta nova forma de terapia.
O que é compaixão?
Em outro texto aqui no site, mencionei que a palavra alemã para compaixão é mitleid, literalmente sofrer (leid) com (mit). A nossa palavra, compaixão, apresenta etimologicamente igual sentido. sofrer (paixão, não de se estar apaixonado, mas de pathos, sofrimento) mais o prefixo com.
Na psicologia, a compaixão pelos outros e a autocompaixão, a compaixão conosco, é entendida como um conjunto de componentes, como habilidades e atributos específicos. O objeto da compaixão, portanto, pode ser outra pessoa ou ser (um bichinho de estimação, por exemplo) ou nós próprios:
Atributos da compaixão
- Cuidando do bem-estar: a vontade de querer aliviar o sofrimento, o stress, a dor…
- Sensibilidade: a sensibilidade ao que está ocorrendo, especialmente no que tange às necessidades
- Simpatia: significa ter ligação emocional
- Tolerância ao stress e às emoções: relaciona-se com a aceitação do que ocorre e com o afastamento da tendência de querer se afastar ou não olhar e observar a dor e o sofrimento
- Empatia: é a capacidade de ver o mundo através do olhar do outro ou de conseguir ver e aceitar o próprio percurso, a própria história, bem como os pensamentos e sentimentos.
- Não-julgamento: quer dizer adotar uma postura de parar de criticar, condenar, rejeitar. É importante lembrar que a palavra inglesa judment, embora signifique também julgamento, no dia a dia é bastante usada como sinônimo de crítica.
A Terapia da Compaixão
Segundo Paul Gilbert, a Terapia Focada na Compaixão surge com a sua percepção de que os pacientes tratavam a si mesmos de uma maneira muito dura, com muitas críticas, hostilidade, raiva e desprezo.
Nesse sentido, um grande objetivo é possibilitar para o paciente o desenvolvimento de uma atitude mais compassiva consigo, a busca de uma voz interior calorosa e amorosa. Assim como falamos com carinho com um amigo, podemos passar a mudar o tom do auto-diálogo e passar a conversar também com um tom de voz mais ameno nesse interminável diálogo interno.
A ideia é bastante simples, mas é fácil de entender o seu possível impacto positivo. Faça o teste:
- Pense em algo que você deveria fazer mas ainda não fez e está se cobrando. Agora, em vez de se criticar ou se cobrar de uma maneira bruta, procure falar para si mesmo o que você tem que fazer como se estivesse falando com um amigo ou com uma pessoa muito querida e especial, com um tom de voz amigável, carinho e amoroso.
Superando ao Autocrítica
Em geral, a cultura ensina os indivíduos por sistemas de punição e reforçamento. É comum que o foco recaia mais na possibilidade de evitar uma punição do que em obter uma consequência agradável.
Por exemplo, na escola, inicialmente, somos constantemente elogiados nas provas e trabalhos. Recebemos estrelinhas da tia e frases como: “Você é excelente!” e “Você é brilhante”. Com o tempo, isso é substituído pelo risco de repetir de ano, tirar uma nota baixa ou não passar no vestibular.
Por esse motivo, os estudantes passam a agir tentando evitar resultados negativos mais do que procurando resultados positivos. Este é apenas um exemplo de como uma suposta crítica dos professores ou dos pais por notas medianas pode vir a ser internalizada. No cotidiano, este esquema se repete.
Portanto, a crítica externa se transforma em uma crítica interna, em uma auto-crítica. E é extremamente comum que o comportamento diário seja pautado na ideia de que sem a autocrítica o comportamento adequado não seria emitido, como um cavalo em uma charrete que não andaria se não fosse chicoteado.
Porém, pensando neste exemplo da escola, é verdade que não é preciso ser deste modo. Da mesma forma como quando éramos pequenos e recebíamos elogios por nossos trabalhos e provas, também podemos agir sem ser “se batendo”, podemos nos elogiar para fazer o que temos que fazer – o que é muito mais agradável e até mais motivador.
Desenvolvendo a compaixão e a autocompaixão
A terapia da compaixão foca-se em diferentes estratégias para o desenvolvimento da compaixão. O paciente aprende a ter compaixão pelos outros e a desenvolver a autocompaixão em um processo que se baseia em psicoeducação e mindfulness.
São muitas as técnicas. Vamos citar duas:
- Pode-se sugerir para o paciente criar em sua mente um lugar seguro, que traga a sensação de calma, tranquilidade, paz e segurança e que possa ser facilmente lembrado em situações de stress.
- Outra técnica consiste em escrever uma carta compassiva para si mesmo. Ao escrever uma carta para si mesmo, há o evidente distanciamento da atitude crítica e a compreensão de que não se trata de aumentar a culpa a fim de resolver o problema e a dificuldade. Então, o paciente escreve uma carta para si mesmo como escreveria uma carta para uma pessoa querida que estivesse sofrendo algo parecido, por exemplo.
Conclusão
A terapia da compaixão ainda é bastante desconhecida aqui no Brasil, o que, imaginamos, se deve à sua recente criação. Recomendamos para maior aprofundamento os livros de Paul Gilbert como Introducing compassion-focused therapy e Compassion focused therapy e The compassioned Mind.
Recomendo também o capítulo “O que é a Terapia Focada na Compaixão”, de Karen Vogel e Lina Sue Matsumoto, no livro Terapias Comportamentais de Terceira Geração, da Editora Sinopsys.
Olá Felipe. Encontrei um capítulo sobre a Terapia Focada na Compaixão no livro “Terapias comportamentais de terceira geração”. Ainda não tive tempo de me deter nele, mas por estar nesse livro, me veio o questionamento: esta terapia faz parte da terceira onda da Terapia Comportamental? Ou é uma modalidade de Terapia Cognitiva? Pelo que vi, esse livro é predominantemente sobre terapias analítico-comportamentais (FAP e ACT principalmente), mas tem alguns capítulos sobre Terapia Cognitiva também. Daí me surgiu a dúvida: em qual dos paradigmas a Terapia da Compaixão se encaixa? Comportamental/behaviorista radical ou cognitivo?
Leonardo,
Em geral se classifica a Terapia da Compaixão como a terceira onda das TCC’s.