“O destino de cada ser humano é criado quando o que está dentro da sua cabeça encontra o que está fora da sua cabeça” (Eric Berne).
Olá amigos!
Às vezes me espanto com a quantidade de teorias psicológicas e terapias que existem. Mas o que mais me espanta, em um sentido positivo, de thaumasein, de admiração, é a fecundidade da maior parte destas teorias.
Uma querida colega de profissão, formada na década de 1980, fez pós-graduação em análise transacional. E, através dela, conheci a teoria e agora estou adquirindo os livros dos principais autores.
No texto de hoje, gostaria de explicar um dos conceitos mais fundamentais da análise transacional, os estados do ego chamados de Pai, Adulto e Criança.
Utilizaremos o livro de Erick Berne, Games People Play e Eu estou Ok, você está Ok como referência.
Os estados do ego
Um dos argumentos mais fundamentais da Análise Transacional é que a psicologia e a psiquiatria criaram uma terminologia muito complicada para o não-especialista. Anos de estudo são, então, necessários para começar a entender o que os autores dizem e isso seria muito distante da realidade de quase todos.
Em certo sentido, o conhecimento técnico do especialista também não o ajudaria a lidar consigo mesmo e especialmente torna complicado explicar para o paciente o que está ocorrendo.
Por isso, o objetivo da Análise Transacional é trazer uma linguagem mais clara e acessível.
Por exemplo, todos nós conseguimos perceber que ao longo de um dia, de uma semana, sofremos modificações no modo como nos sentimos e pensamos. Ou o modo como as outras pessoas mudam de estado de humor com relativa frequência.
Em linguagem técnica, poderíamos dizer que existem três estados básicos: exteriopsíquico (exteropsyquic), neopsíquico (neopsycchic) e arcaicopsíquico (archaeopsychic). [Não consegui encontrar a tradução para tais palavras em português. Suponho que sejam traduzidas desta forma].
Apenas o uso de tais palavras já afasta o entendimento direto, não é?
Em vez disso, os analistas transacionais utilizam:
Pai (Parent)
Adulto (Adult)
Child (Criança)
O único inconveniente de traduzir parent por Pai é que o termo original inclui em seu campo semântico não somente o pai, como os pais, o pai e a mãe, ou as pessoas que cumpriram para a criança esta função.
E o que significa estes estados?
Pai (Parent)
“Você está no mesmo estado mental que um de seus pais (ou pais substitutos) costumava estar, e você está respondendo como ele ou ela responderia, com a mesma postura, gestos, vocabulários, sentimentos, etc” (BERNE, p. 24).
Ou seja:
“Cada indivíduo possui pais (ou pais substitutos) e eles carregam dentro de si um estado do ego que reproduz o estado do ego desses parentes (como é percebido pela pessoa), e esse estado do ego pode ser ativado por certas circunstâncias (exteropsychic). Coloquialmente: cada pessoa carrega dentro de si os seus pais”.
Adulto (Adult)
“Você acabou de fazer uma avaliação autônoma, objetiva da situação e está pensando ou percebendo problemas ou conclusões de uma maneira não preconceituosa ou julgadora” (BERNE, p. 24).
Ou seja:
“Todo e qualquer indivíduo (incluindo as crianças, os esquizofrênicos e deficientes mentais) são capazes de processar informações objetivamente se o estado do ego apropriado estiver ativado (neopsychic). Coloquialmente: todo mundo possui um adulto em si” (BERNE, p. 24).
Criança (Child)
“A maneira e a intenção com a qual você reagiu é a mesma que ocê teria se você fosse agora um pequeno garoto ou garota” (BERNE, p. 24).
Ou seja:
“Todo indivíduo foi antes mais jovem do que é agora e por isso carrega dentro de si relíquias fixadas de anos anteriores que são ativadas sob certas circunstâncias (archaeopsychic). Coloquialmente: Todo mundo carrega dentro de si um pequeno garoto ou garota” (BERNE, p. 24).
É importante notar que todos os três estados são naturais e a presença destes estados, segundo os autores da análise transacional, é encontrada em todos nós. A diferença entre o comportamento de uma pessoa e de outra reside na predominância de um estado sob o outro ou na inconsciência do seu estado atual.
Por exemplo, a Criança pode ser fonte de criatividade, espontaneidade e diversão. Porém, se predominar poderá prejudicar a adaptação e a realização de atividades na escola, faculdade, trabalho ou nos relacionamentos onde, frequentemente, uma atitude mais ligada ao Adulto é necessária.
O Pai possui duas funções básicas:
- permite com que nos transformemos em pais ou mães das nossas crianças;
- permite com que economizemos tempo, fazendo as coisas como “tem que ser feitas” (pelo aprendizado com os pais ou pais substitutos).
História do Pai, Adulto e Criança
No livro Eu estou Ok, você está Ok, Thomas A. Harris conta de que forma Erick Berne percebeu a presença real destes três estados do ego:
“Um advogado, de trinta e cinco anos, de quem ele estava tratando, lhe disse: ‘Na verdade eu não sou um advogado, sou apenas um garotinho’. Longe do consultório do psiquiatra ele era, na realidade, um bem sucedido advogado, mas durante o tratamento se sentia e agia como um menino. Perguntava às vezes durante a sessão: ‘Você está falando com o advogado ou com o garoto?’
Tanto Berne quanto seu paciente ficaram intrigados com o aparecimento e a existência dessas duas pessoas reais, ou estados de espírito, e começaram a se referir a elas como ‘o adulto’ e ‘a criança’. O tratamento centralizou-se no trabalho de separar os dois.
Mais tarde um outro estado começou a tornar-se aparente, um estado distinto do ‘adulto’ e da ‘criança’. Era o ‘pai’, identificado por um comportamento que era a reprodução do que o paciente vira e ouvira de seus pais quando menino’ (HARRIS, p. 40).
Conclusão
Nos relacionamentos interpessoais existem configurações específicas. Por exemplo, uma pessoa pode estar no estado Adulto e a outra também. Mas, em outro caso, uma pessoa pode estar no estado Criança e a outra no estado Pai.
Em breve, escrevemos mais sobre os Jogos da Vida, os jogos que as pessoas jogam (Games People Play).
Dúvidas, sugestões, comentários, por favor, escreva abaixo!
Boa tarde Professor!!!
Achei um tanto complexa essa estrutura da “análise transacional”.
Três pessoas em uma (3 em 1) ???
Mas outros artigos virão para melhor esclarecimento conforme o senhor mencionou.
Abraços.
Sergio.
Oi Sérgio!
A ideia não é tanto de serem pessoas mas estados psicológicos. Por exemplo, se recebermos uma má notícia podemos reagir como faríamos se tivéssemos 5 anos, como os nossos pais fariam no nosso lugar ou como adultos, vendo a situação de maneira mais objetiva.
Atenciosamente,
Felipe de Souza
Também achei a teoria bem complexa!
abrs.
Interessante! Curiosa para saber mais a respeito…
Olá professor!
Acredito que essa diferença de estados do eu seja a causa de muitos conflitos,principalmente,entre casais.
Boa noite, Felipe!
Pensas que, dada a espontaneidade das nossas reações, é possível controlar a predominância de um dos estados sobre os demais ou, pelo menos, trabalhar esse aspecto de modo que se possa criar um hábito de acionar o estado psicológico mais adequado conforme a situação vivida?
Parabéns pelo trabalho e atenção aqui no blog. Um abraço!
Olá André!
Sim, a ideia fundamental da terapia da análise transacional é permitir que possamos utilizar cada um dos estados quando for o mais adequado.
Atenciosamente,
Felipe de Souza
Nossa Felipe eu já tinha está noção sobre minha propria vida, mais faltava as nomeclaturas. Percebo esses estados em minha vida que inclusive me prejudicaram bastante em meu relacionamento. Hoje vejo na fase adulta, passado 37 anos, mais até tempos atras predominava a criança.
Boa tarde, Professor! Tenho percebido, em meu processo de análise, a presença de 3 estados que eu chamo de “Menino” (que sente as feridas da infância), “Adulto Emocional” (que sente os prazeres da vida adulta) e “Adulto Racional” (que percebe os outros e toma decisões). Ao ler este ótimo conteúdo, fiquei com a impressão de que seria possível estabelecer alguma correlação entre estas abordagens, mas não está claro, para mim, o que faria mais sentido entre os “adultos”. Será uma honra saber sua visão a respeito.
O adulto na Análise Transacional é, digamos, a parte nossa que capta as informações (racionais e emocionais), até onde entendo.
Há pelo menos 20 anos atrás, quando era uma auxiliar adminstrativa em uma biblioteca de uma instituição de ensino, me deparei com o livre do dr. Eric Berne e outros que não vou lembrar o nome, talvez Claud…, bem, li, achei interessante a teoria. Mais tarde, me formei em Psicogia, optei pela Psicanalise, mas nunca esqueci esta teoria. Hoje, eis me aqui, 20 anos ou mais procurando por ela.
Bom dia professor.
O que fazer então qua do se foi uma criança revende que teve uma mãe tirana, dominadora e dependente emocional? Hoje me vejo alternando entre uma e outra. E o adulto.n.encontra vez.
Bom dia! Vale a pena fazer terapia para superar o passado e reestruturar esses pontos internos.