Existem alguns medos que são quase universais, ubíquos, estão por toda parte. O medo da morte, o medo de perder o que se ganhou e o que podemos chamar de o medo de parecer ridículo. O medo de parecer ridículo em uma dada situação não é nada mais nada menos do que o medo de parecer idiota, de não se encaixar ou se enquadrar – o medo de ser criticado.
Quando comecei a escrever textos, ideias para romances, poesias (hoje estou um pouco parado com a parte artística), aprendi duas importantes lições que são praticamente idênticas:
– não jogar fora nada que tinha sido escrito;
– escrever primeiro, livremente, e arrumar depois.
Estas duas lições estão interligadas porque elas permitem com que valorizemos tudo. Se não jogamos nem um pedaço de papel com duas palavras fora, passamos a dar valor a qualquer mínimo pensamento que nos veem. Tudo tem igual importância, embora nem tudo seja viável ou bonito. E, próximo disso, temos que não existem erros. Escrever é reescrever diversas vezes até o ponto de perdemos aonde estava o começo do que seria uma escrita “certa” e a escrita a ser corrigida.
A relação que escrever – seja o que for – tem com o tema do nosso texto de hoje é que se expressar desta forma é bastante parecido com criar uma coisa nova, tentar um novo empreendimento, tentar andar e cair ou começar um novo relacionamento.
Conhece o poema do Fernando Pessoa que diz “todas as cartas de amor são ridículas?” Então…
Ridículo vem de rir
Interessante saber a etimologia, a origem das palavras. A palavra ridículo vem da palavra latina ridiculus, “o que desperta o riso”, de ridere, “rir”. E, como sabemos, ser sério – no sentido de ter seriedade e compromisso com as coisas – não significa a exclusão do bom humor.
E por que não rir de si mesmo?
Quando passamos a ter a habilidade de rir da gente mesmo, passamos a lidar melhor com todo o tipo de erro, dos menores aos maiores. No Livro Vermelho, Jung fala sobre a necessidade de aumentar a autozombaria:
“Quem não consegue zombar de si mesmo torna-se objeto de zombaria dos outros. Portanto, aceita também tua autozombaria, a fim de que descaia de ti o caráter de seres deus e herói e te tornes tão somente humano. Teu caráter de seres deus e herói é para o outro uma zombaria em ti” (JUNG, 2013, p. 324).
O ideal do herói e a necessidade de aceitar o humano
É bastante comum vermos análises de psicólogos dizendo que uma pessoa tímida é uma pessoa que se critica, e uma pessoa que tem medo de falar em público, na verdade, está se autocriticando e/ou temendo uma reação negativa dos seus ouvintes.
O que Jung fala neste pequeno trecho do Livro Vermelho é que o ideal do herói é prejudicial. O herói, esta figura arquetípica da mitologia e de tantas narrativas modernas, é aquele que se coloca acima da humanidade, de seus colegas mortais e falíveis.
Pretender ocupar esta posição, ainda que de forma imaginária, é prejudicial porque é um ideal inatingível. Seria como pretender a ser um deus ou um semideus (na linguagem desta obra de Jung). Ora, pretender a perfeição é paralisante, certo?
Voltando ao exemplo do texto. Se eu penso que eu tenho que escrever um texto perfeito, vou paralisar. Afinal, como vou escrever um texto 100 por cento perfeito? Se eu for falar em público, como vou pensar que tenho que falar com 100 por cento de acerto, sem um único erro?
Em meio a este pensamento de querer ser um herói, um sujeito perfeito, encontra-se o medo do ridículo. O medo de que as pessoas possam rir do meu comportamento, seja o comportamento de escrever, falar em público, iniciar uma conversa, um novo relacionamento, andar de bicicleta ou o que for.
Em outras palavras, ter esta perspectiva prejudica o nosso desenvolvimento. Ao longo do caminho, vamos errando, para aprender. Já imaginou se uma criança parasse de andar porque caiu uma vez? Ela não liga. Quando cai, chora ou ri, mas continua tentando.
A superação do medo do ridículo
Então, a melhor forma de superar o medo do ridículo é ser um pouco palhaço e rir de si mesmo. Por que não? Não é melhor rir de um erro passado, de um comportamento desgovernado, desajeitado, estranho no começo do que ficar se lamentando, lamuriando ou se culpando?
Eu citei acima o medo de falar em público porque é um dos medos mais comuns e está inter-relacionado com este medo de passar ridículo. Imagine uma pessoa falando em público. Se esta pessoa comete um pequeno erro, um lapso ou troca alguma letra, que diferença faz? Se ela sorri ou se ela ri e segue em frente não fica tudo bem?
Conclusão
Ao longo do texto eu citei alguns exemplos ligados à autoexpressão, como escrever e falar. Entretanto, em qualquer novo começo, é importante a superação deste medo de parecer ridículo. Antes de concluir, gostaria de propor a seguinte reflexão:
– Já imaginou se todas as pessoas que vieram antes de nós e contribuíram com a nosso sociedade tivessem paralisado por este medo?
Se, por exemplo, Marconi não tivesse ido atrás do seu sonho de enviar uma mensagem através do ar e não tivesse criado o rádio? Ou, indo mais perto, se os nossos pais tivessem ficado tímidos para iniciar um novo relacionamento?
Para fechar, um outro pensamento de Jung: “A vida que eu ainda poderia viver, eu deveria viver e o pensar que eu ainda poderia pensar, eu deveria pensar” (JUNG, 2010, p.121).
Muito legal esse texto, não sabia que a palavra ridiculus estava relacionada com rir, por isso no filme Harry Potter e o prisioneiro de azkaban mostrou um feitiço que se chamava ridiculus que tinha como objetivo fazer um medo tornar se diversão e motivo para dar risada, lembrei dessa cena quando li essa parte, muito interessante… Já estou colocando em prática os ensinamentos desse texto..
Sucesso!!!!
Cara, você é demais. Mal vejo a hora de estudar Psicologia.
Felipe, excelente texto.
Depoimento: Lembrei do tempo que eu tinha medo de falar em público porque me achava “pequena e sem graça”. Demorei para entender que a “graça da fala” está vinculada ao conhecimento. Depois que enxerguei que uma pessoa preparada não tem medo de nada, enfrentei a timidez. Hoje, o meu trabalho é desembraçar problemas e conflitos, desenvolver organização e métodos. Lição: Enfrentar, errar, corrigir e não ter medo de falar não sei.
Esse trechinho diz tudo […] Em outras palavras, ter esta perspectiva prejudica o nosso desenvolvimento. Ao longo do caminho, vamos errando, para aprender. Já imaginou se uma criança parasse de andar porque caiu uma vez? Ela não liga. Quando cai, chora ou ri, mas continua tentando. Prof. Felipe de Souza.
Abs, Raquel
Obrigado Raquel!
É importante voltar para o porquê estamos ali, né? Lembrar que comunicar é tornar (o conhecimento) comum…
Atenciosamente,
Felipe de Souza
Sou sua fã, não vejo a hora de eu concluir o ensino médio e começar a estudar psicologia.. Você é de mais!! Parabéns e muito sucesso, você tem facebook?
Olá Rosane,
Obrigado!
Temos uma página no face:
https://www.facebook.com/tudosobrepsicologia
“Eu só errei uma única vez… Quando eu pensei estar enganado.” Mestre Linguiça. Digo, digo, Professor Girafalles