É bem comum algum conhecido ou parente me perguntar se pode fazer terapia comigo, eu sempre digo que não é possível. Mas as pessoas não entendem o porquê e por isso escrevi esse texto.
Por que psicólogo não pode atender amigos e parentes?
O Conselho Regional de Psicologia diz: “A decisão pelo atendimento é do(a) psicólogo(a), que considerará se o atendimento interferirá negativamente nos objetivos do serviço prestado, uma vez que não há nada na regulamentação que proíba especificamente o atendimento de familiares e/ou conhecidos(as).”
Ou seja, fica a critério do psicólogo e de sua abordagem teórica. Nos meus atendimentos utilizo a psicoterapia de base analítica que para poder ter um bom encontro analítico é necessário que não tenha um vinculo familiar ou amigo. Por quê? Bem é muito simples, irei ilustrar um exemplo de como seria atender um paciente-amigo/familiar.
Um exemplo
Imagina que “Fulano” é um amigo de longa data, passamos por algumas situações e histórias em comum, de repente ele vem pedir meus serviços psicólogos e eu digo que irei atendê-lo.
Ao iniciarmos a terapia iríamos ter uma imagem de como é cada um de nós, eu então ficaria com alguns pontos cegos para serem analisados. Poderia fazer algumas perguntas intimas que ele não se sentiria confortável de responder, já que às vezes pode refletir sua amizade comigo.
Na psicoterapia com base analítica é muito importante a questão de projeção e de transferência, isto é, colocar no outro aquilo que é meu ou que nego em mim, e sentimentos e emoções depositadas no psicólogo. Na terapia constantemente os pacientes projetam no psicólogo e essa projeção é muito importante para análise.
Quando já temos um contato, o processo de transferência ocorre, mas não é tão significativo quanto o que se fosse atender quem não conhecemos. Pois também envolve o sentimento do psicólogo – que chamamos de contratransferência – para o paciente e quando há um contato fora do setting terapêutico perde-se a qualidade da visão do psicólogo.
Por fim gostaria de dizer que na minha visão o atendimento com conhecidos e familiares não é eficaz, mas o psicólogo pode ter uma conversa como amigo e não como analista.
Leia também – 10 sinais de que o profissional da psicologia não é bom
Acredito que as relações que se estabelecem com o convívio familiar, a percepção do caso, bem como sentimentos e emoções interferirão negativamente na metodologia e no resultado do tratamento. Psicólogos não podem atender parentes caso queiram resolver os problemas de seus pacientes de forma eficaz.
Concordo plenamente.
Sim, concordo que os resultados esperados não serão tão satisfatórios quanto se fosse de alguém que não se tenha os vínculos mencionados, até porque sendo alguém da família ou amigo, já existem sentimentos e historias que antecederão o momento terapia e a visão do profissional em si será difícil de separar.
Como estudante de Psicologia ainda não tenho experiência no mercado de trabalho nem na prática clínica, mas acredito que, em algumas terapias e pricipalmente nas cognitivo comportamentais, não deve existir problema em realizar esse atendimento. Vamos supor que eu tenha uma especialização para trabalhar com dessensibilização sistemática de fobias específicas, de acordo com a TCC não existiria uma dificuldade de aplicar a técnica e fazer o acompanhamento com um conhecido/familiar. Portanto, não se pode generalizar, cada caso é um caso e vai depender da demanda do cliente/paciente e da linha teórica em que se segue.
Chris, entendi perfeitamente o que você quis dizer. Mas eu acredito que a psicoterapia não seja só o lançamento dessas técnicas, psicoterapia é mais que isso. Para autoconhecimento, auxílio em resolução de conflitos… Atendendo um paciente que se tenha vínculo, fica dificíl separar a análise em si, do que se observa no consultório, com a IMAGEM que se tem do tempo do vínculo entre o terapeuta e o paciente. Mas é como foi citado acima, não acredito que tenha sido generalizado algo, tanto que no começo se diz a posição do Conselho Regional de Psicologia, onde se diz que a escolha fica para o psicólogo e sua linha teórica (abordagem). Eu, mesmo como estudante, tenho vários amigos que me procuram pra conversar e pedem pra eu fazer terapia com eles, e eu mesmo sendo ESTUDANTE, me imagino na situação e considero super dificil separar a IMAGEM que tenho deles, com a de uma análise psicologica futura.
Eu acho que necessita-se de uma separação nisso. Pode chegar um momento na terapia em que dados super importantes podem não surgir, pelo questão do vínculo antes da terapia. Seja por vergonha, timidez… a omissão pode acontecer.
Concordo plenamente com tudo e talvez não faça sentido o que vou falar mas acho que é relevante.
Acho que o paciente tende a subestimar o psicólogo por conhece-lo pois um psicólogo não é psicólogo o tempo todo, quer dizer, um psicólogo é uma pessoal “normal” com seus problemas também e deve agir “normalmente” durante o resto do tempo no dia a dia. Quando alguém é submetido à psicoterapia ou psicanálise por alguém que conhece, a intimidade vinculada entre os dois pode fazer com que duvide do processo pois está vinculada à imagem de amigo, que é uma pessoa comum e leva a pensar que não deve ser nada demais como psicólogo, fazendo com que perca a autoridade notória, a habilidade que um paciente desconhecido esperaria do psicólogo.
Muito bom, me ajudou muito…
Perfeito! Acredito que embora, não esteja explícito no Código de Ética, nem por isso significa que devemos fazer. É uma questão de bom senso e critérios! Nem sempre uma conduta precisa estar na “letra da lei”, pra ser considerada como (não) adequada.
Ótimo texto.
Sou psicologa e acredito q o CFP deveria considerar anti ético, pois torna praticamentei impossivel separar o profissional do pessoal. O psicologo ja tem uma percepcao pre definida do amigo, ja formou conceito com base em sua vivencia com amigo, com certeza Vai deixar de perceber e direcionar o processo terapêutico
Li os comentários e considero todos de bom tom. Porém é complicado generalizarmos, pois cada caso é um caso. Enquanto ainda estudante fui atendido por um professor com o qual tenho muita amizade e foi tremendamente útil para mim. A abordagem por qual falo, hoje já formado, é a Fenomenologia existencial; ao meu ver caberá ao profissional determinar-se cabido ou não o atendimento à pessoa conhecida. Definir como uma postura anti ética atender um conhecido fugiria um pouco do que a Psicologia se propõe, a de não generalizar os casos. Abraços.
Excelente o seu comentário Jéssi! Obrigado por compartilhar também esta questão do professor e aluno.
PS: os comentários mal-educados eu não publiquei, rs.
Atenciosamente,
Felipe de Souza
Acho que atender amigos/familiares atrapalha e muito nos resultados, pois muitas vezes temos vergonha de falar sobre nossos verdadeiros sentimentos para um conhecido por medo do julgamento e sem contar que um familiar/amigos vai se sentir no direito de se consultar a todo momento em qualquer ocasião e lugar. Eu ainda estou cursando psicologia mas sinto e muito a pressão de todos quererem que eu aja a todo momento como uma psicóloga, as pessoas não conseguem separa o profissional do pessoal, ainda mais nessa profissão que essas duas coisas não devem se misturar nunca.
Atendo amigos e colegas de trabalho, com frequência.
No início tive mais dificuldade pra equilibrar as relações até que aprendi mais sobre o setting terapêutico e como lidar com esses “lugares”.
A Chris e a Jessi comentaram pontos chave pra mim.
Uso abordagem de TCC/ Coaching, e, quando o método é entendido e o objetivo bem definido, a confiança gerada num relacionamento de longa data fortalecem o processo.
Uso também os princípios da Constelação Sistêmica. Sempre que em sessão fica bem estabelecido o “campo dos fenômenos”, temos a clara diferenciacão entre os níveis do que estamos tratando e a vida regular.
Não recomendo tratar questões em que o psicólogo esteja diretamente envolvido ou tenha na vida real alguma ação esperada. Isso pode complicar demais pros dois.
Demais questões do cliente, seja amigo, colega ou recém conhecido, são bem vindas para tratamento comigo.
Daniele!
Você disse tudo! Creio que o CFP não coloca isso como falta ética (embora seja quase que um princípio fundamental para linhas mais ligadas à psicanálise) porque existem vários tipos de psicoterapia e, para algumas, é tranquilo separar. Penso também em áreas como a psicopedagogia, por exemplo, atender um primo de 5 anos que esteja com dificuldades de aprendizagem.
Atenciosamente,
Felipe de Souza
O assunto é interessante e polêmico, porém, como já foi dito, cada caso é um caso. Penso que depende muito do problema, da duração do tratamento, do profissional e do paciente. Uma vez estabelecido o setting e havendo respeito por ambos, o resultado final pode ser tão bom quanto qualquer outro atendimento. Eu atendo pessoas da mesma família separadamente, o que também muitos dizem que não é bom, mas estabeleço regras claras e não tenho tido problemas.
Olá, tenho uma dúvida. Eu comecei uma terapia faz uns 3 anos e parei há 1 ano, o motivo irei explicar: Minha psicóloga e eu ficamos muito próximas, muito amigas, tanto que já conheço a família inteira e frequento a casa dela e da mãe dela. Ela me disse que nunca imaginou que isso fosse acontecer com ela e com um paciente. Quando ela percebeu que estávamos muito próximas ela me disse que precisa vamos parar com a terapia. E paramos. Mas nos vemos sempre.
Só que nessa situação tem um porém; eu me apaixonei por ela. Sou mulher e ela tbm. Sou homossexual assumida e ela não.
Conversei com uma amiga e ela me disse que mesmo criando vínculos comigo ela não poderia ter parado a terapia, só se ela estivesse apaixonada por mim. Eu, claro, não acredito nessa hipótese.
Alguém poderia me ajudar e me dizer se ela poderia ter parado a minha terapia devido ao nosso aproximamento.
Obrigada.
Olá Patricia!
Existem muitos fatores pelos quais um terapeuta pode interromper o tratamento. Um dos casos mais comuns é o que chamamos de contra-transferência.
Pense como se fosse um outro serviço. O profissional não é obrigado a continuar o tratamento. O profissional também pode encerrar por motivos particulares, ok
Atenciosamente,
Felipe de Souza
Gostaria de um conselho, há 02 anos faço terapia e recente descobri que o meu psicólogo conhece as pessoas sobre as quais converso com ele. Estou decepcionado, não por ele conhecer (pois não temos este controle), mas acho que ele deveria ter interrompido a sessão e ter falado comigo sobre a situação, e então ok, poderíamos ou não ter dado continuidade. No entanto, agora me sinto lesado, pois as pessoas sobre as quais converso não são apenas conhecidos, são pessoas próximas dele. Vou encerrar e procurar outro profissional, mas confesso que estou decepcionado com a situação. Não preciso saber da vida do meu psicólogo, e não se trata disso. Mas de transparência pois me sinto constrangido
Olá Marco,
Esta é uma questão delicada realmente.
Mas, como a terapia se funda sobre o sigilo e a confiança, talvez o melhor seja procurar um outro profissional caso não se sinta bem com a situação.
Atenciosamente,
Felipe de Souza
Tenho um amigo recém formado em psicologia (sou estudante ainda, também de psicologia) e por diversas vezes temos conversas que são praticamente uma sessão. Mas como ele diz “posso te analisar, mas devo estar ciente que vamos acabar com a nossa amizade”. Acredito que nas terapias de base psicanalítica o envolvimento do paciente com o terapeuta é muito maior, pelo fato da transferência e tudo mais. Imagina um conteúdo recalcado de uma mãe histérica vindo à tona em uma consulta com a própria filha como analista? Seria uma situação complicada pras duas, acredito. Enfim, ao meu ver, psicólogos podem ajudar pessoas próximas com interferências quando percebe algo errado, mas um tratamento real não acho que seja possível.
Felipe, adoro seus textos. Aprendo muito contigo!
Olá Aline,
Em alguns outros tipos de terapia, talvez seja possível. Mas realmente, quanto à psicanálise, creio ser impossível.
Obrigado!
Atenciosamente,
Felipe de Souza
A discussão aqui está tão boa e qualificada quanto o texto. Muito boa a oportunidade de observar a diversidade de opiniões sobre um tema que a priori parece simples, mas representa muito da personalidade ética do profissional. Penso que não precisa está na letra da lei para que o profissional da psicologia comprometido com sua profissão e , particularmente, com o resultado de seu trabalho não atenda à parentes e amigos e até, filhos de amigos. Eu, psicóloga no máximo fiz e faço o atendimento de emergência para em seguida encaminhar para outro profissional.
Parabém ao autor do texto por proporcionar a oportunidade de discussão de tão importante temática.
CONCORDO CO A COLEGA ZULEIDE PEREIRA
Fico orgulhosa de ver o nível de discursão de do companheiros/as. Tambem sou psicologa e sou contra ao atendimento a familiares e pessoas da messa familia. por ex dois irmão, mae e filho, etc
Concordo, precisamos ajudar e não reviver situações, junto ao cliente, que as vezes estávamos envolvido.
É claro que ao psicólogo não fica vedado o direito de dar sua opinião profissional acerca de conflitos e questões familiares ou de amigos. Aqui entra novamente o bom senso, pois não se pode fornecer um “diagnóstico” fora do setting terapêutico, ou seja, ausente do ambiente de atendimento e sem analisar todo um histórico e demais fatores que interferem em determinada questão (o que não se pode fazer em alguns minutos apenas, no churrasco de domingo). O psicólogo pode contribuir e auxiliar nestas questões específicas até o momento que lhe couber, com base nos princípios éticos que regem a profissão, visando sempre o cuidado e o bem estar do outro.
Ebnilza Nogueira Sena
Sou psicopedagoga clínica e institucional de orientação psicanalítica e especialização em Gerontologia. Trabalho com adultos e gostaria de lembrar que a psicopedagogia não é está restrita ao público infantil, existem várias questões no âmbito da aprendizagem humana – adaptações e superações – do universo adulto.