Olá amigos!
Hoje completa 8 anos que me formei em psicologia (17/07/2006). Esses 8 anos como psicólogo clínico me ensinaram muitas coisas. Gostaria de compartilhar com vocês, os pontos que considero os principais.
1) Todos os começos são difíceis
Esta frase foi atribuída à sabedoria de Confúcio. Bem, não saberemos ao certo. Mas é uma boa frase para começar. Para mim, não foi fácil começar a faculdade de psicologia, por questões familiares e não foi fácil começar minha carreira profissional. O começo de uma terapia também, em geral, não é fácil. As pessoas fazem de tudo para não olharem para si mesmas. Sabiam que uma pessoa comum assiste em média, ao longo de sua vida, a 13 anos de TV? Sim, 13 anos sentando em frente a uma televisão!
Mas voltando, o começo de uma terapia, na verdade, tem início um tempo antes de começar. Quer dizer, começa antes internamente, nos conflitos que não foram resolvidos, nos sofrimentos que foram abafados, nos desejos incontroláveis.
2) A adaptação é necessária
Depois que se começa, o que é iniciado é, por definição, algo novo. Embora o novo possa ser sentido como uma repetição do que já passou, em outro cenário, ele exige mudança, exige adaptação. Se não há uma nova adaptação, fica-se no que já passou ou volta-se para trás, como um caranguejo temeroso. O que não quer dizer nada, sempre quer dizer qualquer coisa e nos interstícios, nos silêncios, nas interrupções, nos erros, os significados vão surgindo, se transformando, tomando outra forma. Mas uma condição fundamental para enfrentar o que surge e o que ressurge é aceitar o paradoxo de que a mudança passa pela aceitação do que se quer mudar.
3) A mudança vem da aceitação
Se alguém quer mudar um problema, uma dificuldade, um sinto-mal do qual clama e re-clama, se quer mudar mesmo, de verdade, tem que, em primeiro lugar, aceitar que há um problema, que há uma dificuldade, que há um mal-estar, um sintoma, uma dor ou o que seja. Até para adquirir uma nova habilidade, como se pode conseguir, se não se aceita a falta, o erro, o empecilho?
Por exemplo, se eu sou péssimo em matemática, como vou desenvolver a minha habilidade se eu não aceito que sou péssimo em matemática? E aí que surge o paradoxo da mudança: só se faz possível mudar ao aceitar, de coração, que é preciso mudar.
4) Coisas embaixo do colchão
Há uma ideia bastante comum de que a terapia nos faz mostrar o que está escondido, o que está embaixo dos colchões, embaixo dos tapetes, dentro de cofres, em diários secretos, na poeira dos olhos. Em uma conversa no intervalo de uma aula na faculdade de psicologia, tomando um café, aprendi com um colega que o inconsciente não tem lugar, ou melhor, não se esconde. A metáfora de um espaço, de um iceberg é tão somente isso: uma metáfora.
Com uma personalidade intuitiva (no sentido junguiano) e um pouco de prática, já se vê que o inconsciente, o Unbewusstesein, o desconhecido, aparece o tempo todo. Em um meio sorriso, em um olhar cabisbaixo, em uma gargalhada. Assim, existe o inconsciente do teórico, daquele que sabe explicar em uma cadeira universitária, e há o inconsciente daquele que o encontra a toda hora na clínica.
5) A psicologia como ética
As pessoas confundem muito a ciência com a ética. A psicologia poderia ser considerada uma ciência – embora devêssemos sempre falar em psicologias. Na atuação, embora a psicologia clínica venha a utilizar todo o suporte do que foi conhecido nos laboratórios, estudos de caso, dados epidemiológicos, estatísticas, etc a atuação será sempre uma ética. Ética do profissional, mas especialmente, ética do paciente ou do cliente (como querem os humanistas).
Afinal, toda e qualquer história é única, nunca vai se repetir, nunca vai ser encontrada em uma manual estatístico.
6) A metáfora da psicologia
Com isso, a metáfora da psicologia tem que ser a individualidade, necessariamente, para todo profissional que atue e não o que fica falando sobre os conhecimentos já conhecidos. Podemos aprender sobre a anima da pessoa, sobre depressão pós-parto, sobre estresse pós e pré traumático, sobre demência precoce, sobre altas habilidades, sobre couraças do caráter. Porém, as pessoas não cabem nas teorias, toda a abstração é útil, e continua sendo uma abstração.
Aqui não posso deixar de citar o Jung: “Conheça todas as teorias, domine todas as técnicas, mas ao tocar uma alma humana, seja apenas outra alma humana”.
7) O valor de uma terapia
Aprendi também na prática que uma terapia não tem valor. Ou melhor, não deve ter um preço tabelado. É curioso, porém, ver que um grande professor meu tinha razão ao dizer que se a terapia for de graça, ela será desvalorizada. Durante um período, atendi voluntariamente durante um dia da semana. De 30 pacientes, apenas 6 continuaram. Este número baixíssimo é explicado pela ideia de que o é de graça é considerado sem valor. Pela psicanálise, conseguimos ver que o dinheiro é importante – para o paciente – para que ele possa dar valor ao tratamento.
Por outro lado, o valor não precisa ser exorbitante, apenas o suficiente para que haja a transferência.
8) O final da terapia
O final de uma terapia é tão variado como são os indivíduos. Muitos pacientes retornam depois de certo período para tocar o que não havia sido tocado no primeiro momento. Muitos outros vão satisfeitos com o trabalho que conseguiram realizar. Há os que não aceitaram que precisam mudar e colocam a culpa de não terem mudado no profissional e há os que medem o sucesso pelo que conseguiram parar de fazer.
Foucault dizia que as ciências humanas e psicologia sempre deixam uma certa sensação de incerteza. No caso da psicologia, imagino que seja pelo fato de que existem pensamentos sobre a psique, que são as teorias e as abordagens, e há o indivíduo que é quem ele é. O final é todo seu.
Leia também – Sentimentos de um psicólogo clínico
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Olá gostei do tema que acabo de ler, sobre as descobertas a partir das experiências clínicas e como sou estudante de psicologia isso é mito contemplador, pois acaba dando uma ideia de como é a prática e de certa forma responde algumas dúvidas, acalma um pouco a ansiedade, rs. Não sei se isso acontece com todo estudante, mas gostaria de saber por que a medida que vamos no aproximando do final do curso, no caso eu sinto tanto medo de não conseguir dar conta quando for profissional, queria que vocês falassem um pouco sobre isso! Obrigada!
Olá, Felipe! Vc abordou temas bem interessantes e nós como paciente ficamos felizes e crescemos um pouco com o que vc nos traz. Vc poderia falar quando o paciente recebe alta? E sobre aqueles que nunca recebem alta? Por que um paciente pode nunca receber alta? Obrigada.
Esse termo couraças do caráter, para mim é novo! gostaria que você desse um exemplo!
o final do meu processo terapeutico de 15 anos com meu psicanalista (e com outros psicoterapeutas, de outras linhas também) foi diferente: eu aceitei que precisava mudar, mas não consegui mudar o que tinha que ser mudado. Mesmo assim, não coloquei a culpa no meu psicanalista. Prefiro pensar que o tipo de mudança que eu precisava (e ainda preciso) fazer, mas não consegui fazer (nem com a ajuda dos psicoterapeutas), foi, era ou é uma questão difícil demais para os psicoterapeutas (de diferentes abordagens) que me atenderam. E não acho que isso seja culpa minha nem deles. Ainda não tentei um psicoterapeuta junguiano e nem um cognitivo comportamental, nem psicodrama. O difícil é que se for tentar todas as abordagens vai gastar muito dinheiro e sem nenhuma garantia de resultado. Enfim, acho que esse é o quadro mesmo e não há muito como escapar disso. É o possível, né?
Olá Felipe,adoro ler seus textos tem me ajudado muito no meu curso de psicologia. Gostaria que você falasse sobre perda, de um modo geral, como lidar com ela. Desde já muito obrigado
Olá Fabricio!
Acabo de publicar – Como lidar com as perdas – 5 Dicas da Psicologia
Atenciosamente,
Felipe de Souza
Boa noite Felipe.
Adoro os seus textos e reflexões, sempre muito coerentes!
Parabéns.
Olá Danielly!
Obrigado querida!
Fico muito muito feliz que esteja gostando!
Atenciosamente,
Felipe de Souza
Felipe, primeiramente parabéns pelo site, sempre abordando ótimos temas e numa linguagem muita clara. Sou um fã, rs.
Gostaria muito que você comentasse algo a respeito da INTUIÇÃO dentro da psicologia, especialmente por Jung, embora não saiba se algum outro teórico tratou deste tema. Também tenho curiosidade para saber qual é a sua abordagem em particular.
Obrigado!
Olá Rodolfo!
Sobre intuição em Jung, veja aqui a nossa aula gratuita sobre os Tipos Psicológicos
Bem, eu faço doutorado em Jung e estudo a Psicologia Analítica e a Psicanálise há mais de 15 anos. Mas hoje, sinceramente, considero difícil falar em uma abordagem. Por dois motivos: um, gosto de estudar todas as abordagens e tenho estudado aprofundadamente a psicologia cognitiva (estamos com Cursos em Vídeo sobre) e, segundo: a clínica é sempre um atendimento individual. Aprendi isso com um grande professor que tive na faculdade que, psicanalista de carteirinha, falava que ele também fazia psicoterapia, quer dizer, cada caso é um caso.
Online, a maioria dos casos é de terapia breve. Por isso e para não ferir nenhuma recomendação do CFP, optei por atender com o Coaching, que é breve e focado em resultados.
Atenciosamente,
Felipe de Souza
Olá, bom dia
Ioná eu estou no 3º período e não vejo a hora de terminar para ajudar meus pacientes. Não sei se estou confiante por que ainda estou nos primeiros períodos e no final estarei com esse mesmo medo seu hehehehe, fique firme e forte, no final tudo dará certo.
Felipe sempre um excelente profissional, espero ser 1/2 do que ele é quando me formar suahushaus.
Abraços
Olá João!
Obrigado por comentar, meu caro!
Bem, é útil ter um modelo (não para imitar), mas como um norte do caminho que queremos seguir, não é mesmo?
No mestrado eu li um texto que achei fantástico, chamado Tradição e Talento Individual do T.S. Eliot. Ou seja, temos o que já veio antes de nós (que é a tradição) e temos o que é o talento individual, o que cada um pode contribuir do que assimilou e transformou da tradição.
Mas é isso mesmo! Confiança e supervisão!
Atenciosamente,
Felipe de Souza
Excelente texto, obrigado por compartilhar conosco essas experiências.
Olá João!
Obrigado!
Atenciosamente,
Felipe de Souza