Autora: Mayara Teodoro

“A hospitalização é uma experiência que não passa despercebida para o paciente que permanece internado e muito menos para seus familiares e/ou acompanhantes. e quando o assunto é internação de crianças, a reflexão deve ser redobrada, uma vez que a doença e o processo de hospitalização podem comprometer sua integridade física e seu desenvolvimento mental” (Mondardo, 1997).

O ambiente médico, especialmente o hospitalar, é um contexto no qual confrontam-se de forma ambivalente e paradoxal sentimentos como vida e morte, cura e sofrimento, qualidade de vida plena e limitada, alegria e tristeza.

A criança doente frente a hospitalização sente grande impacto além do adoecer ela é separada e privada totalmente ou parcialmente dos afetos maternos, comprometendo assim, seu desenvolvimento emocional.

Hospitalização

Segundo Camon (2009), as crianças precisam vivenciar uma relação calorosa, intima e continua com a mãe (ou pessoa que desempenhe, de forma regular e constante, o papel de mãe), no qual ambos encontrem satisfação e prazer. Essa relação é essencial à saúde mental da criança.

A hospitalização é um conjunto de regressões graves que se podem observar quando as crianças são colocadas, no segundo semestre de vida, em creches ou hospitais, regressões essas que se instalam devido à ausência da mãe ou de um substituto.

Estar doente significa estar em situação de fraqueza e dependência, sendo que a doença quase sempre representa sofrimento orgânico e psicológico. quando hospitalizado, o individuo passa a viver em um ambiente novo e estranho, cercado de pessoas desconhecidas, tendo que estabelecer novas relações com a equipe de saúde e o ambiente hospitalar, além de a doença também representar uma nova variável em sua vida. Durante a internação hospitalar, a criança já física e emocionalmente debilitada pela doença passa a ter que enfrentar o seu afastamento do ambiente doméstico, onde vinha desenvolvendo-se de acordo com seu repertório motor social, emocional e intelectual (Chianttone, 1984; Golveis, 1994).

Deve-se observar, no entanto, que em uma enfermaria de pediatria as ocorrências das internações hospitalares não decorrem apenas de problemas específicos de determinada doença. Nota-se que diversas e inúmeras patologias fazem parte deste contexto, além das regras impostas pelos serviços hospitalares e diferentes repertórios comportamentais da criança adquiridas anteriormente, relacionados a estas ou experiências semelhantes.

Em 1982, Heloísa Chiattone, ao implantar o serviço de Psicologia na Pediatria no hospital brigadeiro – SP, visando humanizar o atendimento de crianças internadas, possibilitou às mães participarem da hospitalização de seus filhos. Através da normatização do projeto mãe-participante, ampliou o trabalho de psicodiagnóstico da criança para a intervenção do relacionamento mãe-criança e suas implicações no contexto de hospitalização.

Porém, a hospitalização não deve ser caracterizada apenas pelo objetivo anteriormente citado, sendo atualmente outras consequências da internação hospitalar de crianças devem merecer atenção, com, por exemplo, o desenvolvimento de distúrbios comportamentais temporários, que dependem de fatores como idade da criança; experiências anteriores; diagnóstico e prognóstico do quadro clínico e qualidade das relações familiares antes da internação.

De acordo com Bordin e Corrêa (1990), a partir de uma revisão da literatura e para complementação da observação anteriormente apontada, o desconforto psicológico em crianças diante da hospitalização e doença pode proceder de fatores como o contexto de vida, a não-familiaridade com o ambiente hospitalar e internações prolongadas ou repetidas.

Nichols (1985) enfatiza que o papel do psicólogo em um hospital geral, na assistência a crianças, consiste em dois princípios: entender a rotina e as imposições relacionadas á doença do paciente, que mostram com um estressor em potencial, analisando este aspecto sempre relacionado ao fator hospitalização; e considerar as rotinas hospitalares (horários, manipulações, procedimentos), a cultura médica e o regime da instituição hospitalar como um segundo agente estressor potencial. A compreensão dessas praticas, nas rotinas diárias, torna-se essencial na previsão da ordem dos cuidados psicológicos quanto aos comprometimentos das doenças, especialmente as crônicas, e de suas seqüelas para o desenvolvimento infantil.

Segundo Romano (1999), o psicólogo no ambiente hospitalar deve ser um observador qualificado, além de se colocar como um intérprete flexível dos anseios do paciente e sua família e das normas da instituição, sendo encarado como um agente de transformação no processo de reabilitação. Ao se tratar de crianças hospitalizadas, é importante considerar questões como as reações de cada criança, decorrentes de processos familiares, características ambientais, bem como do período evolutivo em que se encontra.

Desta forma, o trabalho junto a esta população torna-se importante para amenizar os elementos de estranheza (doença e hospitalização) e ameaça de dor/sofrimento frente aos procedimentos invasivos, inerentes a este contexto. Faz-se necessária, portanto, a presença de uma pessoa capaz de ser seu mediador e defensor, no sentido de saber compreender as necessidades e anseios deste momento, para a criança possa enfrentá-los.

 

Contribuições do lúdico

 

Com a hospitalização da criança, que provoca novas experiências emocionais intensas e complexas. O afastamento do círculo social de origem, bem como as interferências nos processos evolutivos da criança que naturalmente levariam a conquistas autonomas, como atividades lúdicas e de aprendizagem, representam perdas significativas para o psiquismo infantil. (conforme citado por trinca, 1987)

Anna Freud menciona que: “a perda de habilidades, quando ocasionado por recorrências médicas, representa uma perda equivalente no controle do ego, um retrocesso em direção a níveis do desenvolvimento infantil mais passivos”.

O psicólogo deve atuar junto aos pacientes com o objetivo fundamental de tentar diminuir o sofrimento inerente ao processo de hospitalização e doença. Dessa forma,  a aplicação do lúdico como terapia (ludoterapia) tem grande importância, pois além de servir como estimulação, motivam, e podem expressar seus sentimentos no ato do brincar. É sempre necessário o acompanhamento enquanto a criança brinca.

O lúdico sempre está presente na vida das crianças, e uma vez hospitalizadas, elas são restringidas do seu meio social, de sua família, visinhos e amigos, e muitas das vezes passam horas sozinhos deitados em uma cama entre quatro paredes. Muitas se reprimem, pois além da ausência de seus familiares, não tem com quem conversar ou interagir. É aí que o lúdico atua como motivador, pois, ele pode ser inserido em diversas situações que estimulem a exploração e o desenvolvimento pleno da comunicação e do dinamismo.

Camon (2003), afirma que na medida em que a criança brinca, ela consegue exprimir seus medos, as dúvidas, o diálogo, fala sobre sua doença, sobre o tratamento, o hospital, a saudade da família, sobre a morte e entre outros assuntos. O ato de brincar minimiza as sequelas do processo de hospitalização, a criança interage com outras crianças, vive momentos em comunidade, auxilia e ajuda, se sente útil, cria, imagina, modifica, constrói e se expressa.

No contexto hospitalar a aplicação deste recurso “lúdico” permite que a criança continue a desenvolver-se pois, como afirma Camon (2003, pg. 28):

         “A criança hospitalizada apresenta uma quebra nessa relação[social, familiar ‘mãe x filho’], podendo apresentar graves deformações emocionais, físicas e intelectuais”.

Ao brincar a criança interage com o meio, modifica o ambiente (quando para de chorar e se distrai com o brinquedo), o comportamento e a estrutura psíquica, ou seja, ao invés da depressão, agonia, ansiedade, o brincar acaba tomando espaço em sua mente. Expressando seus conflitos, frustrações e traumas e vivências cotidianas.

Segundo Amora (1917, pg. 395 e 420), o lúdico é relativo a jogo, ou aquilo que é engraçado. O Jogo por sua vez, é referente à diversão; exercício recreativo. O lúdico não é somente relacionado ao brinquedo, contudo, são todas contingências que oferecem diversão, recreação, graça, motivação, etc.

Com isso, inúmeras atividades podem ser utilizadas como fonte de motivação para as crianças, desde o pintar até teatro, cinema e brincadeiras como “pega-pega”. Vejamos abaixo como o lúdico pode contribuir em diferentes fases de desenvolvimento.

Camon(2003), propõe que o ambiente hospitalar em que estão instaladas as crianças de zero a um ano de idade devem ser alegres e estimulantes através do uso de móbiles presos às grades dos berços e figuras coloridas nas paredes. Também relata a participação de outras crianças hospitalizadas na confecção e aplicação dos móbiles nos berços, fazendo com que elas se sentissem uteis e alegres.

A criança recém-nascida, que durante nove meses se manteve protegida, alimentada, num ambiente calmo e aconchegante no ventre da mãe, depara-se, enquanto hospitalizada, com um ambiente hostil, ameaçador. (CAMON, 2003)

O lúdico pode ser aplicado ao ambiente físico na utilização de figuras alegres, paredes com tonalidades que estimulem motivação, imagens, figuras decorativas, tudo sem exagero, e nunca um ambiente cinzento, sem cor, agressivo.

As crianças com idade de um a doze anos de idade podem ser apresentadas diversas atividades lúdicas como pintura, desenho, teatro, fantoches, brinquedos, atividades especiais(datas festivas), dinâmicas em grupo. São atividades que facilitam a integração e o desenvolvimento social das crianças, além de jogos que estimulam a percepção, memória e atenção.

REFERENCIAS BIBLIOGRÁFICAS

 

ANGERAMI, Camon; VALDEMAR, augusto. A psicologia no hospital. 2ª Ed. São Paulo, Cengage Learning, 2009.

BAPTISTA, Nunes Makilim. Psicologia hospitalar: Teoria, aplicações e casos clínicos. Guanabara Koogan, 2003.