Você sabe o que é anorexia?  Neste texto, além de conhecer mais sobre o que é anorexia, você vai saber sobre a história da anorexia no mundo e no Brasil.

Etimologicamente, o termo Anorexia Nervosa deriva do grego “an”, deficiência ou ausência de, e “orexis”, apetite. Também significando aversão à comida, enjôo do estômago ou inapetência.

A denominação mais específica “Anorexia Nervosa” surgiu com Willian Gull a partir de 1873, referindo-se à “forma peculiar de doença que afeta principalmente mulheres jovens e caracteriza-se por emagrecimento extremo cuja “falta de apetite é decorrente de um estado mental mórbido e não a qualquer disfunção gástrica” (CORDÁS; CLAUDINO, 2002).

Cordás e Claudino (2002), relatam que durante a idade média as práticas de jejum foram compreendidas como estados de possessão demoníaca ou milagres divinos. Descrevem o comportamento anoréxico de 260 santas italianas que viveram entre 1200 e 1600, aparentemente em resposta a estrutura social patriarcal a que estavam submetidas, conhecida como “anorexia sagrada” (sacrifício).

Pela supressão de necessidades físicas e sensações como cansaço, impulso sexual, fome e dor elas pareciam liberar o corpo e alcançar metas espirituais superiores, porém as crenças religiosas pareciam se misturar a outras intenções das jovens, como a perda dos atrativos femininos.

O caso de Santa Catarina de Siena, que aos 15 anos, após a morte de sua irmã e diante de projetos futuros de casamento, iniciou restrição alimentar, preces e prática de auto flagelamento, chegando a induzir vômito através de ervas e galhos na garganta quando forçada a alimentar-se.

Catarina havia feito um voto de castidade quando criança. A inanição gerou um estado psicológico de constante vigília e experiências místicas, causando sua morte por desnutrição aos 32 anos.

Relatam Cordás e Claudino (2002), que o primeiro caso de Anorexia Nervosa aparece em 1689, descrito por Morton em livro sobre doenças consumptivas. Morton comenta sobre influência mútua entre o mental e o físico, ressaltando ainda as emoções, por não serem estes quadros acompanhados de febre ou dispnéia, e sim pela diminuição do apetite, amenorréia, aversão à comida, obstipação, emagrecimento extremo e hiperatividade.

Em 1914, ocorre uma mudança marcante na compreensão da Anorexia Nervosa, sendo vista a partir daí como uma doença orgânica (somática), quando foi relatado por Simmonds um caso fatal de caquexia no qual a autópsia mostra atrofia no lobo anterior da hipófise, e só em 1960 com um número crescente de pacientes com Anorexia Nervosa parecem ter contribuído para o reconhecimento da doença. E finalmente na década de 70 surgem critérios padronizados para diagnosticar a Anorexia Nervosa.

Nos dias atuais não se pode afirmar que Anorexia Nervosa está relacionada aos casos de “anorexia sagrada”, pela pouca informação e documentação falha quanto às motivações reais das santas, porém alguns paralelos são evidentes: ambas não toleram as conseqüências do “comer”, ambas representam “estados ideais”, descrevem excesso de atividades, perfeccionismo, constante vigilância, auto-suficiência e preferência por cuidar dos outros ao invés de serem cuidadas (CORDÁS; CALUDINO, 2002).

Até a década de 70 a Anorexia Nervosa era o único transtorno alimentar conhecido, as buscas de sua compreensão tiveram motivações importantíssimas, pois acometia jovens e, sua possível evolução crônica estava associada à alta mortalidade. A Bulimia Nervosa veio a ser distinguida em 1979 e foi propriamente exposta como uma síndrome isolada da Anorexia Nervosa (CLAUDINO; ZANELLA, 2005).

Claudino e Zanella (2005), chama a atenção: desde a primeira citação há 300 anos, os Transtornos Alimentares no sexo masculino continuam sendo pouco compreendidos e pouco é publicado sobre eles; é interessante perceber que, na maioria das literaturas, os autores negligenciam os homens, referindo-se na maioria das vezes às mulheres, e até três décadas atrás os homens não tiveram participação significativa nas literaturas, porém, vem crescendo o número de publicações e interesse sobre o sexo masculino.

No Brasil, os Transtornos Alimentares tem tido destaque crescente, derrubando um dos antigos preconceitos acerca da inexistência de Transtornos Alimentares em países em desenvolvimento, especialmente em municípios interioranos, devido à criação recatada com que as famílias conduzem seus filhos.

Na última década cresceu muito os grupos dedicados ao atendimento e à pesquisa de pacientes com Transtornos Alimentares nas cidades brasileiras, viabilizando a formação de profissionais habilitados especificamente para essa população (APPLINARIO; CORDÁS; CLAUDINO, 2002).

A incidência de transtornos alimentares praticamente dobrou nesses últimos 20 anos. Especificamente em relação à Anorexia Nervosa, o número de casos novos por ano teve aumento constante entre 1955 e 1984 em adolescentes de 10 a 19 anos.

A prevalência de Anorexia Nervosa varia entre 2% e 5% em mulheres adolescentes e adultas, já a Bulimia Nervosa tem como variável 1% e 3% e a taxa de ocorrência em homens é aproximadamente um décimo daquela observada nas mulheres (DUNKER; PHILIPPI, 2003).

De acordo com Pietro e Lobão apud Claudino e Zanella (2005), a prevalência de Transtornos Alimentares no sexo masculino ainda não está bem estabelecida e, segundo alguns autores, é subestimada, pois os homens continuam sendo excluídos de muitos estudos pelo baixo número de casos.

Essa pesquisa vem elucidar um fato interessante e crescente no mundo atual de que, em homens existe uma incidência relevante, uma vez que a população escolhida foi mista entre homens e mulheres.

Os transtornos Alimentares em homens desenvolvem mais tardiamente do que em mulheres, entre 18 e 26 anos. O desenvolvimento de TAs em homens, relacionados ao medo de envelhecer e intimamente ligado a grupos cujas profissões exigem preocupações exageradas com o peso ou a forma corporal – bailarinos, modelos, jóqueis, ginastas, nadadores, fisiculturistas, corredores e lutadores de luta livre.

Outro fator de risco é a homossexualidade, visto que a forma do corpo e os músculos trabalhados são muito valorizados pelos homossexuais. O diagnóstico de Transtorno Alimentar no sexo masculino continua sendo um desafio, uma vez que os testes de rastreamento necessitam de reavaliação para melhor adequação de sua aplicação entre os sexos (MELIN; ARAÚJO, 2002).

Anorexia é um distúrbio com elevadíssima taxa de mortalidade em torno dos 20%, sendo este maior que os índices de óbitos por câncer de mama. Estima-se que no Brasil bulimia e anorexia afetam 100.000 adolescentes dos quais 90% são do sexo feminino. Dentre as doenças psiquiátricas são as que causam mais mortes, considerada assim um problema crescente no Brasil e no mundo (KOSTMAN, 2004).

O aumento dessa incidência coincide com a ênfase na magreza feminina como uma expressão de atração sexual. Atualmente a sociedade valoriza a atratividade e a magreza em particular, fazendo da obesidade uma condição altamente desvalorizada e rejeitada.

A associação da beleza, sucesso e felicidade com um corpo magro têm levado as pessoas à prática de dietas abusivas e de outras formas não saudáveis de regular o peso.

Ainda em estudos Morgan; Vechiatti e Negrão (2002), relatam a incerteza do papel do ambiente como fator desencadeante, ou se pessoas predispostas a tal doença procuram profissões que exige um corpo mais magro.

Os padrões de beleza hoje, juntamente com os meios de comunicação têm uma forte manipulação sobre as mulheres, uma vez que magreza é considerada ideal. O que se torna uma impossibilidade biológica para a maioria delas, causando insatisfação do próprio corpo. Algumas pesquisas elucidam que a puberdade precoce é um alto fator de risco para os Transtornos Alimentares.

O aumento da gordura corporal em meninas adolescentes causa uma turbulência mental e pode reforçar as preocupações com o peso, aumentando a pressão social para emagrecer.

A Anorexia Nervosa é uma doença que se torna evidente no aspecto físico. As pacientes portadoras de tal patologia sempre “diagnosticam” a doença em uma outra adolescente próxima, justamente porque o aspecto físico chama a atenção de quem conhece o problema. (HERSCOVICI; BAY, 1997).

A Anorexia Nervosa é um distúrbios da conduta alimentar, uma síndrome psicossomática considerada grave e de prognóstico ruim, caracterizada pelo medo de engordar, levando a redução voluntária da ingestão alimentar com perda progressiva de peso.

A avaliação nutricional em transtornos do comportamento alimentar deve focalizar não só os problemas alimentares, mas a intensidade do apetite, presença e duração dos episódios de restrição e/ou compulsão alimentar periódica, assim como as situações sociais que acompanham tais comportamentos (JEOR, 1995).

No dizer de Fontenelle; Cordás e Sassi (2002), transtornos de humor como depressão são quase que universal em pacientes com Anorexia Nervosa e Bulimia Nervosa. Eles são atormentados por ruminações incessantes e intrusivas sobre comida e forma corporal, além de diversos comportamentos ritualizados como restrição da ingestão alimentar, contagem de calorias e excesso de exercícios físicos.

Segundo Schebendach; Reichert-Anderson, apud Mahan; Escott-Stump (2002), a anorexia se dá como forma peculiar de doença que afeta principalmente mulheres adolescentes e adultas jovens entre 16 a 24 anos, sendo caracterizado por emagrecimento extremo, cuja falta de apetite é decorrente de um estado mental mórbido e não a qualquer disfunção gástrica.

Essas pessoas não apresentam perda real do apetite até estágios mais avançados da doença, mas sim uma recusa alimentar deliberada, com intuito de emagrecer ou medo de engordar. Percebe-se nos pacientes excessos de atividades, perfeccionismo, constante vigilância, desinteresses por relacionamentos comuns, auto-suficiência e preferência por cuidar dos outros ao invés de serem cuidadas.

De acordo com a American Psychiatry Association-APA (1993), tal doença tem como característica diminuição de apetite, amenorréia, impotência, aversão à comida, obstipação, emagrecimento extremo e hiperatividade.

O paciente acredita que o alimento é lesivo e deve ser evitado, este apresenta inseguranças pessoais e busca por aprovação, e ressalta a contribuição familiar para manutenção dos sintomas.

A psicopatologia central da anorexia compreende uma constelação específica de deficiências do ego e da personalidade, consistindo em três áreas do funcionamento: transtorno da imagem corporal, transtorno da percepção ou interpretação de estímulos corporais (como reconhecimento da fome), e uma sensação paralisante de ineficiência que invade todo o pensamento e atividades do paciente.

Pacientes com Anorexia Nervosa possuem uma aparência típica e característica. Seu corpo caquético pré-pubescente, freqüentemente faz com que eles pareçam mais jovens do que são. As características físicas comuns incluem lanugem, cabelos sem brilho e quebradiços, cianose de extremidades e pele seca que pode apresentar-se amarelada devido a hipercarotenemia (SCHEBENDACH; REICHERT-ANDERSON, apud MAHAN; ESCOTT-STUMP, 2002).

Referências Bibliográficas

American Psychiatry Association (APA). Pratice guidelines for eating disorders. American Journal Psychiatry,Washington,1993,v.150,p.207-228.

CLAUDINO,A.M.;ZANELLA,M.T.Guia de Transtornos Alimentares e Obesidade, São Paulo: Manole,2005.p.3-163.

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DUNKER,K.L.L.;PHILIPPI,S.T.Hábitos e Comportamentos Alimentares de Adolescentes com sintomas de Anorexia nervosa.Revista de Nutrição.Campinas, v.16,n.1,p.51-60,2003.

FONTENELLE,L.F.;CORDÁS,T.;SASSI,E. Transtornos alimentares e os espectros de humor e obsessivo- compulsivo,Revista  Brasileira  Psiquiatria,São Paulo,v.24, supl.3,p.24-26,dez.2002.

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SCHEBENDACH,J.; REICHERT-ANDERSON,P. Nutrição dos distúrbios alimentares.  In: MAHAN, L. K.; STUMP, S. E. Krause: Alimentos, Nutrição e Dietoterapia, 10.ed. São Paulo: Roca, 2002. p.499-513.